Fundação Maitreya
 
Srimad Bhagavam - A Sabedoria de Deus

de Swāmi Prabhavānanda

em 10 Mai 2006

  Bhagavata Purāṇa- um dos 18 Purāṇas conta a história de Kṛṣṇa
“Depois dos Upaniṣads e da Bhagavad-Gītā, o Śrīmad Bhāgavatam é a mais importante das Escrituras Indianas. Através de histórias das vidas de Avatāras, sábios, devotos, e reis, populariza as verdades contidas nos Vedas. Neste momento mais de duzentos milhões de Hindus encontram nesta Obra as mais apreciadas expressões de fé religiosa e os seus mais queridos exemplos. Estudá-la, é a melhor forma de nos familiarizarmos com a religião viva da Índia.
A sua peculiar excelência é que reconcilia coração e cabeça, devoção com aprendizagem. “É cozinhado com a nata do conhecimento,” assim diz Śrī Rāmakrisna, o último dos grandes profetas indianos, “e imerso no mel do Amor.[...]”.


Os Estágios da Vida

Canto VII – Capítulo II

Yudhishthira então inquiriu sobre os deveres nos vários estágios da vida. Em resposta Nārada continuou:

O principal propósito de todas as observâncias religiosas e práticas espirituais é o auto-domínio e a perfeição na meditação.

Este corpo tem sido comparado a um carro a cavalos. Os sentidos são os cavalos. A mente são as rédeas. O intelecto o passageiro. As energias vitais são as rodas. A virtude e os vícios são os raios que suportam as rodas. O ego é o condutor. Raiva, ódio, ciúme, tristeza, cobiça, ilusão, orgulho e sede pela vida, são os inimigos encontrados ao longo da estrada. Quando o condutor consegue trazer os cavalos e o carro sobre controlo, o seu coração torna-se puro, e então ele encontra graça divina dentro de si. Com a espada da discriminação, afiada pelo conhecimento, ele conquista todos os inimigos. Ele perde todo o medo e usufrui de felicidade divina.

Existem certas virtudes que devem ser cultivadas por toda a humanidade em todos os estágios da vida. Estas são, sinceridade, bondade, perdão, discriminação, controle da mente, mestria sobre as paixões, consideração, continência, caridade, franqueza, contentamento, devoção aos professores espirituais, evitar conversação frívola, procurar a mais alta Verdade, servir todos os seres como a Deus.

Certas verdades existem também, reveladas através das experiências dos sábios, que devem ser
observadas por toda a humanidade. O nascimento humano é a porta através da qual nós podemos alcançar nascimentos mais ou menos evoluídos, consoante os nossos feitos e acções. O nascimento humano é também a porta através da qual poderemos alcançar a mais alta realização, a absoluta liberdade.

Quando o homem desiste da procura da felicidade através da porta dos sentidos, e aprende a olhar para dentro, só então ele encontrará Paz e Glória.

Apegar-se à riqueza e à vida material é a causa raiz de todo o medo, miséria e ilusão. O homem deverá então parar de procurar a riqueza e deixar de desejar ansiosamente os prazeres mundanos.

A abelha atravessa muitos esforços para juntar o mel: o homem rouba esse mel. Da mesma forma, aqueles que se esforçam por ganhar e juntar riqueza, raramente usufruem dela.

O rei das cobras não se esforça por procurar comida; ele permanece satisfeito com o que seja que a Natureza lhe oferece. Assim vive o sábio. Seja lá o que vem da Natureza, ele fica contente.

Umas vezes ele dorme debaixo de uma árvore, outras, ele caminha por um palácio. Sobre todas e quaisquer condições, ele é a mesma e feliz pessoa. Aprendei a serdes contentes sob todas as circunstâncias. Aquele que tem contentamento no seu coração encontra o bem em qualquer lado e em todos os momentos.

Aqueles que usam sapatos para protegerem os seus pés, não se magoam com os espinhos ao longo do caminho. Da mesma forma, aqueles que aprenderam a estar contentes sob todas as condições, jamais serão magoados pelos espinhos que jazem pelo caminho da vida.

O descontentamento é causa de inquietação e de desejos passionais. Onde existe descontentamento, todo o esforço, toda a aprendizagem, toda a fama e glória ou conhecimento, são em vão. O coração descontente está cheio de sede e ambição mesmo quando tem todo o prazer e divertimento do mundo ao seu alcance. Muita alma se degradou pelo descontentamento.

Renuncia ao desejo e à posse das coisas deste mundo, deixa a gula e a cobiça; e assim liberta-te da raiva. Apercebe-te e realiza a evanescência dos efémeros prazeres dos sentidos. Procura a divina consciência, a sabedoria do Um, e dessa forma conquista assim todo o medo.

Aprende a discriminar entre o real e o irreal, libertando-te assim da tristeza e da ilusão.
Conquista o orgulho e o egoísmo servindo os grandes sábios, os guias espirituais, as manifestações da pureza e da santidade.

Afasta os obstáculos do caminho da meditação pelo controle da palavra e do pensamento.
Se alguma pessoa te magoar, não procures retribuir a injúria, nem sintas sequer qualquer ressentimento no teu coração, mas antes sente o bem por ela, pois o Amor conquista o ódio.

Aquele que seriamente procura alcançar auto-domínio, deverá desviar-se de distracções mundanas. Deverá ser moderado a comer, a beber e a divertir-se. Indolência ele deverá evitar.

No primeiro estágio da vida, aquele que desejar o auto-domínio deverá encetar a vida de estudante. O Mestre lhe removerá as trevas da ignorância e lhe revelará a luz do conhecimento.

De modo a se preparar para as instruções dadas pelo Mestre, o estudante deverá estabelecer a calma e a quietude no corpo e na mente. Ele deverá se libertar de indisposições físicas através da prática de exercícios de respiração que poderão ser dados pelo Mestre, e tomando somente o alimento necessário para manter o corpo vigoroso e a mente calma.

Sentado erecto, numa postura orientadamente confortável, ele deverá repetir a Sagrada Palavra OM – meditando no seu significado.

Ele deverá libertar a mente de todos os pensamentos e desejos distractivos. Quando a mente se põe a deambular, que ele a traga de volta e a tente estabelecer na Luz divina dentro do centro etérico do coração.

A prática constante trará paz e tranquilidade ao íntimo. A chama do desejo será extinta, assim como o fogo esmorece à falta de combustível.

A mente que já não se agita pela luxúria está sempre tranquila. Assim que as inquietas vagas da mente assentam, surgirá gradualmente a felicidade divina.

A Sagrada Palavra OM é o arco. A mente pura é a seta. O Eu Divino é o alvo. Assim como a seta se torna una com o alvo, assim também pela prática da concentração a mente se unirá ao Eu Divino.

Se houver devoção pelo Mestre assim como por Deus, facilmente se alcançará domínio e mestria.

O Mestre é na verdade um com Deus. Vivendo em próxima associação com o Mestre, seguindo as suas instruções na meditação e na compreensão das Escrituras, o estudante aprende a ver Deus, a Alma de todas as almas em todos os seres.

Depois de terminar o seu curso de estudo, ele é livre para se casar e se tornar um homem de família, ou pode levar uma vida de retiro, ou tornar-se monge, consoante o seu temperamento e o conselho do seu Mestre.

O homem de família, que tem de encontrar obrigações na vida social, deve executar todos os deveres como forma de reverência. Ele deverá reverenciar professores espirituais e se associar a pessoas espirituais. Ele deverá aproveitar os tempos livres na escuta ou estudo da Palavra Sagrada. Ele deverá participar nas actividades da vida, mas permanecer livre de quaisquer apegos.

Ele poderá possuir riqueza, mas deverá lembrar-se que antes de tudo é um guardião de Deus, a quem tudo pertence. Ele deverá olhar pelas necessidades dos pobres e dos destituídos e servir o Senhor ao servir todos os seres sencientes.

Ele não se deverá apegar à carne nem aos prazeres sensuais. Ele deverá aprender a discriminar e realizar a alegria da vida no espírito e conhecer a glória do Eu Divino no seu íntimo.

O monge que busca poderá ir onde quiser mas não se deverá apegar a nenhum sítio ou país. Ele deverá aprender a encontrar paz e júbilo na meditação sobre o Ātman, o Eu Divino. Aos seus olhos, todos os seres deverão ser iguais. Ele deverá conhecer o Senhor como o supremo objectivo e finalidade da vida. Ele deverá meditar sobre as escrituras e evitar estudos que desviem a sua mente de Deus.

Ele nunca deverá fazer discípulos à força ou utilizando falsas promessas.

Para um monge que se entrega a desejos de luxúria e para um homem de família que renuncia aos deveres familiares – para ambos será vergonhoso, nefasto e enganador.

O maior dever da vida é ter prazer na Palavra de Deus e meditar constantemente n’Ele como a forma de toda a verdade.

Canta o nome e louva o Senhor, e canta a sua glória. Medita nos seus atributos divinos; constantemente lembra-te d’Ele e da Sua Presença. Serve e adora o Senhor do Amor. Presta-lhe respeitos saudando-O; conhece-O como o verdadeiro Amigo; rende-te a Ele.

Todo o Universo poderá se comparar a uma larga árvore. Todos os seres se poderá dizer que são os seus ramos e folhas. Hari, Deus, é a raiz da árvore. Quando o Senhor é adorado, todos os seres rejubilam.

O Senhor é todo-presente. Ele existe tanto no que é senciente como no não senciente. Todo o país é seu país, e Ele se manifesta em todo o lugar, mas os sítios mais sagrados são aqueles onde se Lhe oferece a maior devoção – nos templos ou nos corações dos seus devotos.

Aqueles que desejam o maior bem, deveriam viver onde se é possível se inter-relacionar com pessoas espirituais.

Hari é também chamado Puruṣa, o Morador íntimo, pois Ele habita nos corações de todos os seres – em deuses e anjos, em homens, em pássaros e bestas, e em todo o aparente objecto sem vida. Mas apesar de Ele residir em todas as creaturas e coisas, há uma diferença no seu respectivo grau de manifestação.

Nos seres humanos Ele é mais manifesto do que nos outros. Mais uma vez, nos seres humanos Ele é mais ou menos manifesto, consoante o grau da ciência do saber e consciência realizadas.

Um sábio Brahmin disse: “Depois de muitas experiências de alegria e miséria, Eu realizei que Ātman é pura felicidade e que o homem é Ātman. Quando o homem para de se esforçar em busca de felicidade nas conquistas materiais mundanas e aprende a olhar para dentro, ele encontra o extático Ātman.

“O Ātman por Si só É, Um sem segundo. O Ātman por Si só é a Realidade. Está de facto iludido aquele que não conhece o Real.

“Para alcançar o Ātman, desiste da consciência dos muitos e absorve-te no Um.

“Aprende a ver o Um nos muitos. O processo para praticar e realizar esta Unidade consiste em ver causa e efeito como uma e a mesma, em vendo todo o Universo como uma expressão de Deus. O processo de realizar a Unidade em acção consiste em se render todas as palavras, actos, e pensamentos a Brahman, ou Deus.

“O processo de realizar a Unidade nos objectos e pessoas consiste em ver Deus em todos os seres e coisas.

“Aquele que segue o caminho da vida contemplativa conhece o seu Eu como divino e em Unidade com Deus. Deus é o princípio, Ele é o meio e Ele é o fim. Ele é o que regozija e o Objecto regozijado. Ele é o que está em cima e o que está em baixo. Ele é o que conhece e o que é Conhecido. Ele é a palavra falada e o fôlego que a profere. Ele é o manifestado e o Imanifestado.
“O homem que segue este trilho realiza, que Deus por si só É, que nada é separado d’ Ele ou para além d’Ele. Tendo realizado esta verdade, o devoto não mais é atraído pelas coisas do mundo.
“Aquele que está calmo e sente o mesmo em relação a todos os seres, é uma alma livre. Apesar da sua sabedoria ser profunda, a sua simplicidade é como a de uma criança.”

Compilado pelo Sábio Vyāsa

Srimad Bhagavatam (Canto VII – Cap.II) – ‘The Wisdom of God’
Tradução do Sânscrito para o Inglês - Swāmi Prabhavānanda
Tradução do Inglês para o Português - Dhammiko
   


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Impresso em 29/3/2024 às 10:01

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