Fundação Maitreya
 
Meditação - O Caminho da Harmonia

de Maria Ferreira da Silva

em 21 Dez 2013

  Naturalmente, um dos graves problemas da maioria das pessoas e que acaba por se transformar num verdadeiro obstáculo é quererem obter da Meditação factos extraordinários, experiências transcendentes, ou seja, resultados imediatos, quando o objectivo da prática é bem diferente; é o auto-conhecimento, pois sem ele a Meditação torna-se árida ou pode transformar-se num campo de abertura a energias astrais que bloqueiam a sua prática. E então, pelo auto-conhecimento se chega ao Conhecimento e realização do Divino.

O caminho da Harmonia

Para falar de Meditação sem dúvida que terei de me basear nos sistemas filosóficos e religiosos da Índia, de cujas tradições vem esta prática. O Sāṃkhya, o Yoga, e o Vedānta onde se inclui, Kapila, Vaśiṣṭa, Patañjali, Śaṅkara, Aṣṭāvakra, Rāmānuja, e tantos outros sábios que nos legaram métodos práticos ou sistemas filosóficos e religiosos nos quais a Meditação tem um lugar preponderante. Também no Jainismo e no Budismo permanece através dos séculos a prática da Meditação.
O Jainismo, é uma das religiões filosóficas mais antiga da Índia com o culto aos Tīrthankaras, onde os seus seguidores, os mais austeros renunciantes, (śramanas), se retiram para a floresta para poderem praticar a Meditação sem os entraves dos apelos do mundo, com o objectivo de atingirem a paz e a iluminação.
Já Buddha na sua busca encontrou os Jainas e conviveu com o seu líder espiritual, Mahāvīra, contemporâneos, portanto. Sendo também a prática da Meditação, a base do seu Ensinamento, foi aquilo que o Buddha preservou de todas as filosofias já existentes e, em qualquer escola ou linha budista encontra-se este requisito. Na realidade, não há praticamente nenhum sistema filosófico ou religioso na Índia que não se fundamente na Meditação, sendo naturalmente o Yoga a base de toda a prática.

Os Yoga Sūtras de Patañjali, quanto a mim, o mais extraordinário método com princípio meio e fim para o caminhar espiritual consciente, é baseado na Meditação, permitindo esta a clareza mental para observar os conteúdos da própria mente e conhecer os obstáculos, que quando confrontados podem ser removidos.
Segundo Patañjali, «Deve observar-se com consciência o funcionamento da mente e quanto mais se conhece a mente, tanto melhor o seu uso. Sem o conhecimento da mente, não se conhece as suas tendências e assim poder resolver os problemas internos». Desta forma, se desenvolve a auto-consciência, que é o maior bem que o ser humano pode ter: auto-domínio de si! A chave do desenvolvimento espiritual está em treinar a mente para interesses e valores mais elevados.

Compreende-se então, que o caminho da Meditação acaba numa necessidade (imperiosa) de investigar a verdadeira natureza da mente para o auto-domínio de si. Nenhum progresso espiritual ou mesmo humano é possível sem a disciplina da mente.
O entendimento sobre Meditação e o próprio meditar depende do grau do consciente de cada um e da intensidade do apelo interior, bem como a honestidade consigo mesmo para que a prática resulte numa constante abertura de Consciência. É esta expansão de Consciência que indica a cada um, não só o seu grau de evolução, como o progresso que se vai fazendo ao nível de atitude e de compreensão em todo o seu contexto espiritual, que abraça o psíquico e o físico (o cérebro recebe impulsos), numa verdadeira escalada rumo à sua própria harmonia e ao Divino. Ou seja: uma coisa não está dissociada da outra. A Meditação tem na realidade esse objectivo.
É este ponto importante; a ligação subtil e espiritual que pela prática da Meditação se vai obtendo, desenvolvendo no Ser a aspiração superior e vai tocando gradualmente esse Conhecimento do Divino em si mesmo e, que permite adquirir também, sucessivamente, maior segurança no Caminho. Com a Meditação ganha-se alento, coragem e consequentemente, a Harmonia.

Harmonia no viver; que se traduz na prática pela atitude e que se repercute no dia a dia, quer nos gestos, na fala, nos períodos de silêncio, nas emoções e nos sentimentos, já que se vai adquirindo também maior felicidade interior. A felicidade interior; diamante tão precioso e tão procurado por todo o ser humano e tão simples de obter…

Vejamos: os seres que mais se notabilizaram como exemplos de perfeição e Sabedoria foram sem sombra de dúvida, aqueles que nas suas vidas tinham não só, um propósito espiritual universalista, como se regiam por métodos de disciplina, que pela sublimação (superação) dos hábitos perniciosos, conseguiram chegar à Harmonia. Todos eles têm em comum uma clareza mental tal, que foram capazes de elaborar os métodos que seguiam legando à humanidade verdadeiros tesouros de Sabedoria: Pitágoras, Jesus, Orígenes, Filon de Alexandria, Buddha, Śaṅkara, Aurobindo, etc…

Diz na Bhagavad Gītā:
«Os homens de acções virtuosas, cujas culpas se esgotaram, se libertaram do engano das dualidades, adoram-Me com firme convicção».

Infelizmente hoje em dia, desenvolvem-se métodos de Meditação para relaxar, mas o verdadeiro objectivo da Meditação, na realidade é chegar ao estado de bem-aventurança que é o Samādhi e como consequência o Conhecimento do Divino. (Samādhi é um dos pontos chave a atingir, contudo, outros estados se seguem no caminho da iluminação).
A Meditação não se faz para relaxar, mas quem medita relaxa…
Elaboram-se conceitos errados no Ocidente acerca da Meditação. Criam-se expectativas que acabam em frustrações e assim facilmente se desiste. É um conceito falso de que a Meditação é para relaxar; a Meditação é um acto religioso para a ligação ao Divino. E só este propósito pode levar ao sucesso da prática e consequentemente à harmonia. A nobreza da Meditação está neste objectivo!
É pela Meditação que se desenvolve especialmente a clareza do pensamento, pois é uma forma que permite desenvolver as capacidades de inteligência, bem como auxilia a desbloquear dos obstáculos mentais, que continuamente sobrecarregamos com as emoções exageradas e atitudes negativas de viver, tal o medo, a raiva, o ódio etc…

«Uma das razões porque se requer a Meditação é a de permitir às células cerebrais, ocuparem-se menos com o corpo e os seus mecanismos. A Meditação apazigua, ordena e conduz as células para os outros campos ou esferas do cérebro que nunca têm oportunidade de se manifestar, visto o ser humano estar sempre em acção e obrigar o cérebro a trabalhar constantemente no seu nível primário dos movimentos corporais». (Livro, Tratado de Meditação).

O maior contributo para um cérebro saudável (órgão fisco suporte da mente) e consequentemente uma mente equilibrada e cristalina é a prática da Meditação que permite aos circuitos neuronais produzir as necessárias substâncias e reorganização de células de forma naturalmente serena, tal a produção de melatonina, assunto tratado no livro “O Silêncio”.
Embora, razão e emoção sejam essenciais na vida humana, a mente, só fica pura e tranquila quando se liberta das tensões emocionais. A natureza emocional manifesta-se de uma forma espontânea sobrepondo-se à razão. Porém, a razão cultiva-se conforme a mente se purifica pela plena atenção ou disciplina. As emoções sublimam-se pelo auto-domínio. O domínio de si, cria auto-consciência e assim se obtém a capacidade para reconhecer e identificar as próprias emoções evitando os obstáculos onde se desenvolve melhor compreensão das causas dos sentimentos e a diferença entre sentimentos e emoções, porque as emoções, se não forem sublimadas acabam por ser um entrave à expansão de Consciência e à harmonia, já que elas se instalam na mente e no coração bloqueando. Também pela Meditação se desenvolve melhor tolerância às frustrações, menos impulsividade, menos solidão, melhor compreensão para os outros.

Diz no Maitreyi Upaniṣada:
«Mediante a disciplina se obtém a purificação da mente. Mediante a purificação da mente se alcança a claridade de entendimento. Através do claro entendimento ganha-se o auto-conhecimento. Quem logra o conhecimento de si mesmo não regressa ao plano mortal».

Naturalmente, um dos graves problemas da maioria das pessoas e que acaba por se transformar num verdadeiro obstáculo é quererem obter da Meditação factos extraordinários, experiências transcendentes, ou seja, resultados imediatos, quando o objectivo da prática é bem diferente; é o auto-conhecimento, pois sem ele a Meditação torna-se árida ou pode transformar-se num campo de abertura a energias astrais que bloqueiam a sua prática. E então, pelo auto-conhecimento se chega ao Conhecimento e realização do Divino.

«Uma mente purificada torna-se forte e desbasta o caminho das dificuldades pela vontade, e não vacila no controlo das emoções, obtendo o sucesso no encontro perante si mesma, pela qual a mente fica pronta para os estágios de contemplação (absorção em Samādhi)». (Livro, Tratado de Meditação)

Ultrapassar os obstáculos de forma consciente é a coroa da realização espiritual.
Alguns dos obstáculos são: amor-próprio, convencimento, ideias e conceitos firmes como inabaláveis, rancor, despeito.
O que se requer: vigilância (plena atenção), para assim impedir que as falsas noções criem obstáculos à claridade mental.

No livro, Agni Yoga encontra-se:
«Muitas vezes discernimos obstáculos grandes e deixamos escapar do nosso campo de visão uma multidão de pequenos».
Ou, «Um olho de águia é necessário não para distinguir a montanha, mas um pequeno grão de areia…».


Concluindo, se a prática da Meditação for conduzida pela sincera aspiração espiritual e honestidade consigo mesmo, ou seja, não se enganar a si próprio, negligenciando, obtém-se a Harmonia…
   


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