Fundação Maitreya
 
Sanchi

de Benoy K. Behl

em 24 Jun 2010

  A arte do período Sunga, entre 185 e 73 a. C., estabeleceu os alicerces das ricas tradições artísticas dos séculos seguintes. A arte budista mais antiga representando temas da vida do Buddha e das histórias jatakas, floresceu durante o reinado dos reis Sunga, que adoravam divindades hindus. Esses monarcas doaram generosamente os rendimentos de muitas aldeias para promover e manter lugares de culto budistas.


Pormenor - Vessantra JatakaUma Maravilha da Arte Budista

A harmonia e a inter-relação de toda a criação é um tema omnipresente. Há sempre a eterna árvore da vida, que nos mostra as numerosas riquezas do mundo ao nosso redor. Apresentam-se as formas com uma apreciação de beleza e de abundante fertilidade, que assegura a continuação da vida.
Essas formas mundanas consistem em portas e divisões, que separam o mundo quotidiano do interior sagrado. As suas representações ajudam-nos a apreciar todas as formas da vida na sua verdadeira perspectiva, como um reflexo da verdade eterna, sem forma, que devemos alcançar. Para além das portas e das divisões há uma representação profundamente simples: um stūpa, que nos indica a verdade que devemos seguir, deixando para trás as atracções e as coisas materiais deste mundo.
Uma outra tradição que foi claramente estabelecida durante esse período é o patrocínio real (sempre indirecto durante a fase inicial) de todos os monumentos sagrados. A arte budista mais antiga, representando temas da vida do Buddha e das histórias jatakas floresceu durante o reinado dos reis Sunga, que adoravam divindades hindus. Esses monarcas doaram generosamente os rendimentos de muitas aldeias para promover e manter lugares de culto budistas.
A cidade de Vidisha, hoje em dia Besnagar no estado de Madhya Pradesh, situava-se na rota comercial que ligava as planícies do Rio Ganges à costa Ocidental da Índia. Era um grande pólo comercial, um empório no meio das vastas e férteis planícies da Índia Central. Entre os objectos mais antigos que foram encontrados, há uma grande coluna de pedra com uma inscrição, datada de cerca de 120 a 100 anos a.C. Foi erguida por um devoto grego chamado Heliodoro, para honrar Vasudeva, um dos numerosos nomes do deus indiano Vishnu.
Em Sanchi, numa colina baixa ao lado de Vidisha é possível ver os mais magníficos stūpas budistas do período antigo. Meio caminho pela colina e encontra-se um stūpa que contém os corpos dos mais conhecidos mestres budistas do período Maurya. A grade ou vedika ao redor do stūpa data de cerca de 100 anos a. C.
O vedika é adornado com medalhões e metades de medalhões que contém relevos. Todas as superfícies das colunas nos cantos são esculpidas. Há uma imagem da divindade da prosperidade e abundância, Lakshmi, flanqueada por dois elefantes que a borrifam com água. Os relevos não são muito profundos e segue um estilo semelhante aos relevos de Bharhut.
O mais espectacular dos stūpas budistas do período antesPorta setentrional de Cristo situa-se no cimo da colina em Sanchi. É provável que tenha contido relíquias do próprio Buddha. Esse stūpa foi originalmente construído no século III a. C. Existe uma coluna de Ashôka à entrada do stūpa, ao sul. Em meados do século II a. C., expandiram o stūpa para o dobro do seu tamanho original, e as suas mais antigas grades de madeira foram substituídas por grades maciças de pedra.
Pelo fim do século I a. C, a dinastia Satavahana, os reis da região do Decão, estenderam os seus domínios à Índia Central. Adoravam as divindades hindus. Todavia, realizaram renovações significantes de pedra, assegurando que esse stūpa seria um dos mais importantes monumentos budistas de sempre. Há quatro magníficas portas de pedra ou toranas, cada um medindo mais que 11 metros. Completaram-se no século I d. C. As tradições artísticas que foram estabelecidas durante o reinado dos Sungas alcançaram o seu auge nessas esplêndidas portas.
As 631 inscrições nas toranas dizem-nos que as esculturas eram doadas pelo povo de Vidisha. Essa arte foi criada para jardineiros, mercadores, donas de casa, freiras e monges. As mulheres contribuíram quase com metade das doações.
As enormes vedikas são simples e despojadas de esculturas. As toranas têm duas colunas direitas, que apoiam três vigas ou arquitraves horizontais. Entre as colunas e as arquitraves, ao este e ao norte, há magníficos elefantes. A porta ocidental é adornada com anões. A porta ao sul tem leões.
Os anões ou ganas são representados como muito gordos, com grandes barrigas a sair dos seus dhotis (vestuário masculino indiano). Cada um tem uma cara diferente, com uma expressão facial personalizada. Os anões continuaram a ser o motivo preferido dos artistas indianos. Realçam o sentido da realidade apresentado na arte, onde o humor e o sublime coexistem, lembrando-nos que tudo tem o seu lugar na nossa existência. Mais tarde, os anões seriam um tema importante nos templos dedicados à divindade Śiva.
A adoração da fertilidade e da abundância da natureza, que se vê em Bharhut é presente aqui também. As portas contêm vinte e quatro mulheres auspiciosas. Na porta oeste há uma linda yakshi que agarra os ramos da mangueira em cima da sua cabeça. A noção da vitalidade criativa da natureza e a sua fertilidade é representada duma forma muito realista. Embora a figura do yakshi esteja ligada à matriz, também é esculpida em três dimensões e todos os pormenores foram cuidadosamente esculpidos também na parte de trás.
Como em Bharhut, há figuras masculDevas graciosos - porta ocidentalinas nas portas também. Uma figura veste-se com trajes indianos, com um dhoti e turbante. Uma outra figura usa trajes gregos e agarra numa lança e escudo de desenho estrangeiro. Os relevos esculpidos nas portas representam as histórias dos jatakas sobre as vidas anteriores do Buddha e eventos da sua vida. Os cenários das histórias reflectem a vida nas cidades e aldeias dessa época, quando esta arte foi criada. Os relevos de Sanchi são um importante registo visual da arquitectura e do estilo da vida desse período.
Aqui, a personalidade do Buddha não é o foco principal. O Budismo é representado por muitos símbolos. A roda representa o primeiro ensinamento da doutrina budista; a árvore bodhi representa a iluminação; enquanto as pegadas humanas e o pára-sol em cima de um espaço vazio anunciam a presença do Iluminado.
As portas do stūpa em Sanchi apresentam um vislumbre da vida dessa época em rico pormenor. Enquanto as figuras de Bharhut são individuais, aqui é possível encontrar grandes grupos com muitas figuras. São representadas numa variedade de posturas e no meio de muitas actividades. Também já não se limitam a vistas frontais mas é também possível ver perfis de três quartos de uma figura. Os artistas de Sanchi representaram uma vasta gama de expressões, sem nenhum esforço.
Os artistas de Sanchi utilizaram perspectivas múltiplas e vários pontos de vista. Assim, podiam apresentar o ponto onde era mais fácil reconhecer o objecto ou figura em questão. Os eventos e as figuras distantes são representadas na parte superior do painel, enquanto as figuras que estão mais perto do público são representadas na parte inferior. Os painéis não usam a técnica da perspectiva diferenciada. Todos os elementos são considerados importantes e são apresentados numa grande dimensão, com pormenores claros. Uma outra característica da arte antiga indiana é o facto de que as folhas das plantas ou das árvores são representadas numa grande dimensão, para que possam ser facilmente identificadas.
Um outro stūpa mais pequeno em Sanchi continha as relíquias de dois discípulos do Buddha, Modgalyana e Sariputra. A única porta deste stūpa foi também construída sob a supervisão dos Satavahanas durante o século I d.C. Como nos stūpas mais antigos, há uma visão do mundo que vê o ritmo infinito de toda a criação. A vinha da criatividade confere vida à vedika. Representa a vida em muitas formas: flores, frutas, animais, humanos e criaturas míticas.
O stūpa em Sanchi tem uma inscrição na porta oriental que refere que as belas esculturas nas portas eram feitas pelos escultores de marfim de Vidisha. Com efeito, a pedra é esculpida tão elegantemente que reflecte o cuidado e os pormenores do trabalho feito sobre marfim delicado.
Entretanto, os reis Stavahanas e os Kstrapas governaram as vastas regiões do Decão ocidental e oriental. Enquanto os monarcas que eram seguidores das divindades hindus, encorajaram os estabelecimentos budistas. Inúmeras cavernas dedicadas ao Buddha e numerosos stūpas foram criados durante o seu reinado.

Cortesia da Revista India Perspectives.

   


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