Fundação Maitreya
 
A Sabedoria de Deus

de Swāmi Prabhavānanda

em 06 Fev 2017

  O homem ignorante, ligado a seu corpo, é controlado pelas impressões e tendências criadas por suas acções passadas, e é limitado pela lei do Karma. Mas o homem sábio, seus desejos sendo extintos, não é afectado por acções. Ele está além da lei do Karma. Uma vez que sua mente repousa no Ātman, ele não é afectado pelas condições que o cercam, embora possa continuar a viver no corpo e embora seus sentidos possam se mover entre os objectos dos sentidos. Pois ele compreendeu a vaidade de todos os objectos e na multiplicidade vê um Senhor infinito. Ele é como um homem que despertou do sono e aprendeu que seu sonho era um sonho. Só em ignorância, antes de se chegar à iluminação, as diversas acções, que são os trabalhos dos guṇas, parecem-se unir à Essência. Com o amanhecer do conhecimento, desaparecem. O Ātman, no entanto, permanece não afectado, pois nem na ignorância se torna impuro com os actos, nem no conhecimento se torna livre de impureza.

em ‘Srimad Bhagavatam – The Wisdom of God’ traduzido para o inglês por Swāmi Prabhavānanda; tradução portuguesa de Rafael Roque.

Capítulo XX - A Realização de Deus

Uddhava:

Ó Senhor, para quem existe este universo de relatividade? Não pode existir para o Ātman, pois a Essência (Ātman) é auto-luminosa, imutável, transcendente, pura; Nem pode existir para o corpo, que é um objecto material, desprovido de inteligência. No entanto, não há como negar que esta existência relativa existe. Para quem, então, existe?

Śrī Kriṣṇa:

Para o homem que não sabe discriminar, ignorante da sua verdadeira Essência (Ātman), para aquele que identifica seu Ātman com o corpo, os sentidos e prāṇas, esta existência relativa, embora não tenha realidade, parece real. Assim como quem num sonho se parece deparar com experiências reais, da mesma forma o homem ignorante, imerso em ilusão, confunde sombra por substância.

Tal como um sonho que parece trazer a experiência de muitos problemas a um homem dormindo, mas que deixa de o iludir mal ele acorda, da mesma forma, a tristeza, a alegria, o medo, a raiva, a ganância, a paixão e todas as outras emoções, bem como as experiências do nascimento e da morte, são sentidas como reais pelo homem que se apega ao ego, mas deixam de o iludir assim que conhece o Ātman, a verdadeira Essência.

O homem individual é o Ātman associado e identificado com o corpo, os órgãos do sentido, os prāṇas e a mente. O homem é caracterizado por suas acções e seus guṇas (qualidades). Com o passar do tempo, ele percorre o ciclo do nascimento e da morte.

A mente, a fala, os prāṇas, o corpo e as acções, embora não tenham uma realidade absoluta, manifestam diversas formas e personagens. O sábio corta definitivamente todo o apego a estes com a espada do conhecimento, que é aguçada pela adoração ao seu Guru, e, assim liberto, ele vagueia à vontade sobre a face da terra.

Aquilo que exclusivamente no início era existência, e que no fim exclusivamente será existência, e que é a causa manifestadora exclusiva deste universo – só isso é existência absoluta. Como é que se pode saber esta verdade? Sabe-se pelo estudo das Escrituras, pelo raciocínio, pela prática de austeridades, e pela experiência directa e compreensão pura espirituais.

Tal como o ouro existe antes de ser transformado em ornamentos, e existirá depois dos ornamentos se derreterem, e permanece também como ouro enquanto é conhecido pelos vários nomes de ornamentos, assim também eu estou em relação ao universo - Eu era, eu sou e eu serei.

Só a existência transcendental é real. Por causa dessa existência o universo existe, e essa existência existe mesmo quando o universo cessa.

Aquilo que não está nem no princípio, nem no fim, mas apenas no meio, só existe em aparência. É um mero nome e forma. Na verdade, a experiência que é causada e trazida à luz pela existência transcendental, que inclui tudo, não pode ser outra senão aquela mesma existência.

Brahman existe por si e é auto-refulgente. O universo que é caracterizado pela mudança era inexistente no começo, mas por causa do poder em Brahman conhecido como rajas, parece existente no agora.

Aparência não é realidade: aprenda isto de um mestre sábio. Recorra ao caminho que leva ao conhecimento de Brahman, e removendo todas as dúvidas sobre a Essência, e desapegando-se dos sentidos, o assento dos desejos terrenos, deleite-se na Essência suprema.

Discrimina entre aparência e realidade. O Ātman, a Essência, é a realidade, diferente da aparência, diferente do corpo, dos sentidos, da mente, do intelecto, do ego, dos elementos subtis e grosseiros.

Para o homem que realiza, que conhece plenamente meu ser, é indiferente se os sentidos constituídos por guṇas estão interiorizados ou exteriorizados. Que importa ao sol se as nuvens se juntam ou se dispersam?

Tal como o éter permanece inalterado pelas estações em mudança, assim a invariável, indestrutível Essência, que é separado do ego, permanece intocada pelo trabalho de sattwa, rajas e tamas. Mas o homem, identificando-se com os gunas, acaba por se envolver no ciclo do nascimento e da morte.

O contacto com as coisas deste mundo, que são criação de māyā, devia de ser evitado até que o apego, que é uma mancha na mente, tenha sido removido através da devoção a mim.

Tal como uma doença que, se não for tratada adequadamente volta uma e outra vez a incomodar um homem, da mesma forma o apego e as tendências formadas na mente pelos hábitos passados, se não forem eliminados completamente, atormentam com recorrência um yogī sempre que este entra em contacto com o mundo objectivo.

De facto, até mesmo os Devas têm ciúmes de um yogī, de como ele se esforça para superá-los alcançando Brahman. Eles, portanto, tentam desviá-lo de várias formas, se o encontram de vigilância fraca. Mas se por causa de tendências acumuladas criadas por hábitos passados, e também por causa da influência subtil dos Devas, um yogī não é inteiramente bem-sucedido em seus esforços para libertar seu coração do apego, na próxima vida ele terá sucesso e alcançará o objectivo do Yoga. Suas lutas nesta vida darão fruto no próximo.

O homem ignorante, ligado a seu corpo, é controlado pelas impressões e tendências criadas por suas acções passadas, e é limitado pela lei do Karma. Mas o homem sábio, seus desejos sendo extintos, não é afectado por acções. Ele está além da lei do Karma. Uma vez que sua mente repousa no Ātman, ele não é afectado pelas condições que o cercam, embora possa continuar a viver no corpo e embora seus sentidos possam se mover entre os objectos dos sentidos. Pois ele compreendeu a vaidade de todos os objectos e na multiplicidade vê um Senhor infinito. Ele é como um homem que despertou do sono e aprendeu que seu sonho era um sonho.

Só em ignorância, antes de se chegar à iluminação, as diversas acções, que são os trabalhos dos guṇas, parecem-se unir à Essência. Com o amanhecer do conhecimento, desaparecem. O Ātman, no entanto, permanece não afectado, pois nem na ignorância se torna impuro com os actos, nem no conhecimento se torna livre de impureza.

O Ātman em si é sempre puro.

À medida que o sol nascente dissipa a escuridão dos olhos dos homens e descobre o que antes estava oculto, assim o amanhecer do conhecimento remove o mal do intelecto dos homens e revela o Ātman. Então os homens se conhecem como o Ātman, e o Ātman como eles próprios.

O Ātman é auto-luminoso e não-nascido; é existência, conhecimento absoluto, o olho dos olhos, um sem segundo. Está além da palavra. Por sua existência todos os poderes do corpo desempenham suas funções. O universo finito e múltiplo não tem existência independente da Essência infinita. O finito é a leitura da finitude no Infinito. Vendo o finito na Essência infinita é uma ilusão da mente.

Esta auto-existente Essência deve ser realizada pelas práticas do Yoga. Se o corpo de um yogī que está seguindo o caminho do Yoga e que ainda não é um adepto, sucumbir à doença, ele deve curar-se por tais remédios como a concentração, exercícios de respiração, postura, austeridades e mantras, bem como pela medicina. As doenças mentais, como a luxúria, o desejo, o egoísmo, a vaidade, devem ser curadas meditando em mim, cantando meu nome e servindo grandes mestres. Existem algumas pessoas equivocadas que praticam Yoga para obter saúde e juventude perpétua, e adquirir poderes extraordinários; mas tal acção não é aprovada pelo sábio. Na realidade, tal acção é vã, pois a vida é mortal. Devia-se desejar saúde e força apenas como um meio de se me servir e alcançar meu ser.

O yogī que pratica este Yoga, entregando-se a mim e não tendo nenhum outro desejo além de mim, não se deixa frustrar por nada. Sua é a felicidade que não se desvanece.
   


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