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  Mudança climática  18 Abr 2014

Por David Biello

Os ricos brincam com fogo, e os pobres se queimam. Isso resume um relatório publicado em 31 de Março pelo Painel Intergovernamental sobre a Mudança Climática (IPCC) da ONU sobre os riscos cada mais pronunciados da mudança climática. Até mesmo nações ricas enfrentarão sérios desafios. “Nenhum habitante deste planeta ficará livre da mudança climática”, declarou Rajendra Pachauri, director do IPCC, em uma conferência de imprensa durante a publicação do relatório em Yokohoma, no Japão.

De acordo com Pachauri e as centenas de cientistas que prepararam o relatório, a mudança climática não é mais algo que acontecerá no futuro. Ela já está ocorrendo, e já está afectando pessoas em todos os sete continentes e sete mares. Actualmente o mundo tem um clima diferente daquele de algumas décadas atrás, graças à queima de combustíveis fósseis, desmatamento e outras actividades humanas.

Como resultado, a necessidade que nações de todo o mundo têm de se adaptar já existe, de acordo com um relatório da segunda equipe de cientistas do IPCC (conhecida como Grupo de Trabalho II), que avaliou mais de 12 mil artigos científicos para produzir um consenso autoritário sobre os impactos da mudança climática, sobre as vulnerabilidades da sociedade e do mundo natural, e também sobre como podemos nos adaptar a um clima diferente. “Nós vemos impactos dos equadores aos pólos, e dos litorais às montanhas”, apontou o biólogo Christopher Field, da Stanford University, co-director do Grupo de Trabalho II, durante a conferência de imprensa.

De acordo com a primeira equipe de cientistas do IPCC, que avaliou a física fundamental da mudança climática e publicou um relatório em Setembro oportunidade de evitar um aquecimento global catastrófico não desapareceu, mesmo que o mundo já tenha queimado metade dos combustíveis fósseis que poderia queimar.

Mas o mundo precisa abandonar logo seu hábito de [emitir gás carbónico, referido como simplesmente] carbono.

Desde os anos 1880, 531 gigatoneladas de carbono já foram emitidas, e os cientistas do IPCC estimam que não mais de 800 gigatoneladas possam ser emitidas para que exista uma boa chance de se manter o aquecimento global abaixo de dois graus Celsius.

De acordo com os cientistas, se o aquecimento ultrapassar esse limiar, danos sérios serão causados a ecossistemas e sociedades de todas as partes do mundo. Quanto maior o aquecimento, maior o risco de “impactos severos, pervasivos e irreversíveis”, afirma o novo relatório.

Infelizmente, apenas no intervalo entre este relatório e sua última publicação em 2007, a mudança climática ficou 40% mais forte graças a emissões cada vez maiores de gases estufa.

O mundo já está 0,85 grau Celsius mais quente em relação a 1880. Actualmente, o aquecimento global é “inequívoco” e concentrações de CO2 atingiram níveis “sem precedentes pelo menos nos últimos 800 mil anos”. Ou, como Michel Jarraud, secretário-geral da Organização Meteorológica Mundial declarou durante a conferência: “A ignorância não é mais desculpa. Nós sabemos”.

Vista dessa forma, a mudança climática se torna uma proposta de gestão de risco, particularmente dada a incerteza a respeito da intensidade dos impactos, e de quando vão ocorrer.

Os maiores riscos incluem o aumento do nível do mar para pequenas ilhas e litorais, inundações, destruição de infra-estrutura diante do clima extremo, morte de peixes e outros animais, insegurança alimentar e mortes provocadas por ondas de calor. A demanda por ar-condicionado vai aumentar muito conforme o século 21 avança.

Alguns desses impactos já estão sendo sentidos: do derretimento de calotas polares e geleiras, a uma maior de elevação do nível do mar que a prevista pelo IPCC no passado.

Plantações, como as de trigo e milho, foram mais prejudicadas por ondas de calor e secas do que beneficiadas por níveis maiores de CO2, o que às vezes pode permitir um melhor crescimento de plantas. Algumas plantações em locais como o norte da Europa e o sudeste da América do Sul, onde a seca não se estabeleceu, de fato melhoraram.

Até agora, os danos superam os benefícios. Reduções em plantações de trigo e milho já tiveram um impacto sobre preços de alimentos e, argumentam alguns, sobre a estabilidade de algumas nações.

O clima extremo, seja ele na forma de inundações ou incêndios florestais, continua a piorar, e a mudança climática provavelmente aumentará problemas de saúde já existentes, sejam eles malária ou insolações.

O maior impacto pode ser a disponibilidade de água doce. Todos esses riscos, explicados em detalhes no novo relatório, afectam principalmente os mais pobres, especialmente a subsistência de agricultores de todo o mundo que dependem de chuvas consistentes para se alimentar. “A própria existência dessas pessoas está ameaçada”, argumentou Pachauri durante a conferência de imprensa.

De acordo com o novo relatório, a mudança climática também aumentará o risco de conflitos, sejam eles guerras civis ou entre estados-nações por recursos fundamentais ou fronteiras.

Em resumo, as mudanças climáticas tornarão o combate à pobreza muito mais difícil.

Mas ainda existem oportunidades para adaptação.
Comunidades, cidades, estados e nações já começaram a se adaptar, seja com a administração de água em San Diego, na Califórnia, ou plantando mangues para estabilizar os litorais na nação-ilha de Tuvalu.

As mudanças climáticas podem ser remediadas com a redução da poluição que as causam, além de melhorias na sociedade para reduzir suas vulnerabilidades.

Para as pessoas mais pobres, a adaptação futura pode incluir o deslocamento – seja voluntário ou após desastres. E a maneira como sociedades escolhem se adaptar será vital, já que algumas escolhas – a geo-engenharia com vulcões artificiais ou a construção de paredões marítimos, por exemplo – podem se provar um fracasso no longo prazo.

O mundo natural também teve que se adaptar: animais, e até plantas, estão mudando sua localização ou alterando comportamentos sazonais ou migrações. Alguns animais marinhos se deslocaram até 400 quilómetros em busca de climas igualmente frios, e a acidificação dos oceanos está se acelerando.

Conforme o clima continua a mudar, espécies enfrentarão desafios cada vez maiores, e muitas podem ser extintas conforme o aquecimento global as conduz para o desastre e outras ameaças, como a perda de habitat. Ecossistemas inteiros serão transformados, como a marcha de arbustos na antiga tundra da Sibéria e da América do Norte. “Nós podemos estar diante do limiar da sexta extinção em massa da história do planeta, ou além dele”, observou Field.

Reduzindo o optimismo a respeito da adaptação está o fato de o IPCC ter consistentemente subestimado a velocidade e a escala das mudanças climáticas. A melhoria contínua dos dados sobre impactos é um desafio constante para a comunidade científica.

E, no quadro geral, como o co-director Field declarou em seu discurso para abrir a sessão do novo relatório: “Lidar de maneira eficaz com a mudança climática é um dos desafios que definirão o século 21”.

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