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Revisitando a questão “Fé e Razão”

de Adel Sidarus

em 06 Nov 2007

  (...anterior) O comum das pessoas terá que aceitar a literalidade textual da mensagem divina, capaz como tal de os levar a aderirem à mesma, o que é essencial. A tal elite deverá ela laborar no sentido de assegurar a “harmonia” entre esse mesmo texto e as verdades desenvolvidas pela lógica filosófica, mas sem divulgar, menos ainda impor, ao conjunto dos crentes, os resultados do seu ijtihad (‘esforço intelectual’). Até porque grande parte desse labor dificilmente poderá alcançar o consenso daqueles sábios (ijma‛), princípio base da coesão social islâmica. De certo modo, o Comentator cordovês defende não tanto uma “dupla verdade” mas dois níveis ou registos de verdade em consonância com as capacidades das pessoas e a sua adequada preparação intelectual.

O curioso nesta apologia do pensamento filosófico é que a argumentação que a sustenta não é de tipo filosófico mas sim jurídico, como se tratasse de uma fatwa ou parecer legal. Manifestamente, o autor sentia a ameaça dum totalitarismo “ortodoxo” e queria consequentemente ilibar as ideias e posições filosóficas de qualquer suspeita de heresia (bid‛a), e até justificar, em termos “islâmicos”, a necessidade objectiva da interpretação apropriada do texto sagrado para não colidir com aquelas, que têm a sua autonomia própria.
Alguns investigadores, incluindo pensadores contemporâneos muçulmanos, querem ver neste discurso averroísta, difuso de resto em toda a sua obra filosófica, os fundamentos do princípio de “laicização” da sociedade, a separação funcional entre a instituição religiosa e as instâncias do Estado. Não sei bem se colocar a questão nestes moldes se coaduna com a visão global da sociedade desse tempo, sela ela islâmica ou cristã. A verdade é que «os dois geniais pensadores de origem peninsular que foram Ibn Rushd e Ibn Khaldun surgiram numa época adversa à sociedade islâmica. A revolução epistemológica que introduziram no panorama da cultura de então não chegou a dar os seus frutos, pelo menos do lado muçulmano. É só neste século [XX], mercê do trabalho de valorização efectuado pelos meios arabistas europeus – convém frisá-lo – que árabes e muçulmanos se confrontaram com esse legado de alcance universal.»

Concluíamos esta afirmação augurando que «esta corrente se afirme e se amplie, rasgando novos horizontes epistemológicos e culturais para os desafios da ‘hora planetária’». Vimos hoje que os tempos não são ainda favoráveis para tal. Mutantis mutandis os muçulmanos de hoje se sentem agredidos e ameaçados, originando em muito deles reacções identitárias contrárias.
Fosse o que fosse, o mal é não vermos a complexidade do nosso ser e até da vida, que pensamos poder dissecar e controlar a todos os níveis, no quadro de uma revolução tecnológica sem par ou de um “pensamento único” impermeável entre povos e culturas. Porém, se nos interrogarmos sem preconceitos, a nós pessoas humanas do século e milénio presentes e à panóplia de culturas e civilizações do planeta, veríamos que convivem de facto em nós vários registos do conhecimento ou da “verdade”, que têm funções diferenciadas e... que se chega a eles por caminhos também diferenciados. De qualquer modo, procedemos por aproximações progressivas, mesmo ao nível dos conhecimentos ditos científicos ou racionais, sejam eles relativos ao mundo físico e material, sejam eles ao nível metafísico e espiritual.

*****

Concluímos com uma breve apresentação da publicação aqui referida. Ela abre com uma longa introdução (pp. 7-47), onde a autora lembra em grandes linhas a figura de Averróis (§) e de sua obra, convenientemente contextualizadas, antes de apresentar e analisar o Fasl al-maqal. Termina com um glossário dos termos técnicos árabes e a bibliografia. A tradução, abundantemente anotada, é fluida e bem ponderada em função dos leitores lusos. Parte do texto estabelecido por G.F. Hourani (Leiden, Brill, 1959), não sem tomar em consideração as numerosas e qualificadas versões em línguas europeias. Os termos árabes importantes vêm regularmente transcritos e, como se disse, listados e explicados no “glossário” final.
Aguardamos da jovem autora, presentemente professora de filosofia islâmica na Universidade Americana do Cairo, outras publicações do mesmo tipo, pois que a biblioteca lusa, em geral, e os meios universitários, em particular, carecem grandemente delas.

Adel Sidarus
(Universidade de Évora)
   
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