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As Quatro Nobres Verdades
de Ajahn Sumedho
em 26 Jun 2008
(...anterior) Este ensinamento das Quatro Nobres Verdades é para nos ajudar a usar a inteligência, a habilidade de contemplar, reflectir e pensar, de forma sábia e não de forma auto-destrutiva, egoísta ou rancorosa.
Aspiração Correcta
O segundo elemento do Caminho Óctuplo é sammā sankappa, por vezes traduzido como “Pensamento Correcto”, o pensar de forma correcta. Mas na realidade, possui uma qualidade mais dinâmica, como por exemplo “intenção”, “atitude” ou “aspiração”. Eu gosto de usar o termo “aspiração” que de certa forma é bastante significativo neste Caminho Óctuplo, porque nós aspiramos.
É importante perceber que aspiração não é desejo. Em Pāli a palavra “taṇhā” significa desejo que provém da ignorância, ao passo que “sankappa” significa aspiração que não surge da ignorância. Pode-se pensar que aspiração é um tipo de taṇhā, o desejo de querer ser iluminado (bhava taṇhā), mas sammā sankappa tem origem no Entendimento Correcto, o observar claramente. Não é querer tornarmo-nos algo, nem sequer se trata do desejo de sermos iluminados. Com Entendimento Correcto toda essa ilusão e forma de pensar deixa de fazer qualquer sentido.
A aspiração é um sentimento, intenção, atitude ou movimento dentro de nós. O nosso espírito eleva-se, não se afunda - não há desespero! Quando temos Entendimento Correcto aspiramos à verdade, beleza e bondade. Sammā ditthi e sammā sankappa, Entendimento Correcto e Aspiração Correcta, são chamados de paññā ou sabedoria e formam a primeira das três secções no Caminho Óctuplo.
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Podemos reflectir: porque é que nos sentimos insatisfeitos mesmo quando possuímos o melhor de tudo? Mesmo que tenhamos uma bonita casa, um carro, o casamento perfeito, filhos bons e inteligentes e tudo o resto, não estamos completamente felizes e certamente também não estamos satisfeitos quando não temos todas estas coisas!... Se não as temos, podemos pensar, “Bem, se eu tivesse o melhor, estaria satisfeito”. Mas não estaríamos! A terra não é o lugar para nossa satisfação, nem é suposto ser. Quando compreendemos isso, deixamos de esperar contentamento do planeta Terra, deixamos de fazer tal exigência.
Até percebermos que este planeta não pode satisfazer todos os nossos quereres, continuaremos a perguntar, “Porque é que não me satisfazes, Terra Mãe (§)?” Somos como meninos da mamã, constantemente a tentar sugar mais, e a querer que ela nos nutra e nos torne felizes.
Se estivéssemos contentes não nos questionaríamos sobre as coisas à nossa volta. No entanto, reconhecemos que existe algo mais para além da terra, debaixo dos nossos pés; existe algo acima de nós que não conseguimos entender bem. Temos a capacidade de questionar e ponderar a vida, de entender o seu significado. Se quisermos saber qual o significado da vida, não podemos estar só satisfeitos com bens materiais, conforto e segurança.
E assim sendo, aspiramos a saber a verdade. Podemos pensar que isso é uma forma de presunção, “Quem é que eu penso que sou? Tão pequeno e insignificante a tentar descobrir a verdade de tudo”. Mas essa aspiração existe. Se tal não fosse possível porque é que a teríamos? Considere-se o conceito da realidade suprema. Uma verdade absoluta ou suprema é um conceito muito refinado; a ideia de Deus ou da imortalidade é de facto um pensamento muito refinado. Aspiramos ao conhecimento dessa derradeira realidade. O nosso lado animal não aspira; não sabe nada acerca de tais aspirações. Existe em cada um de nós uma inteligência intuitiva que quer saber: está sempre connosco, mas evitamos compreender e valorizar. Geralmente ignoramos ou desconfiamos dela. Especialmente os materialistas modernos - pensam que se trata apenas de uma fantasia.
Quanto a mim próprio, fiquei verdadeiramente feliz quando compreendi que o planeta não é a minha verdadeira casa. Foi algo de que sempre suspeitei.
(... continua)
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