Fundação Maitreya
 
A saúde e a alimentação

de Maria Ferreira da Silva

em 19 Out 2022

  A Meditação para além de ser uma prática espiritual, já que devolve ao Ser a sua ligação superior ou Divina, é sobretudo uma forma medicinal natural de preservar o equilíbrio físico e mental. Conservar a saúde, não só é um dever como constitui uma forma de autoestima e de autoconfiança, que passa também pela forma como se alimenta, já que o corpo físico e mente interdependem, e para um bom resultado das suas respectivas funções requer-se qualidade alimentar. A alimentação é um complemento à Meditação e um passo importante para o equilíbrio biológico. Assim, uma boa escolha alimentar passa pelo conhecimento das propriedades dos alimentos e da forma como se devem conjugar para serem ingeridos. Grande parte do mau estar mental (confusão e desânimo) é causado pela alimentação. As causas podem ser diversas, tais como, má conjugação de nutrientes, alimentos muito elaborados e fermentados que se tornam pesados e que são designados por alimentos tamásicos.

Preservar a saúde.
Existe na tradição indiana uma classificação dos elementos da natureza, quer referente ao universo, quer ao homem que são os guṇas, qualidades da matéria, que se designam por sáttvicos, rajásicos e tamásicos. Sáttvicos são os alimentos mais puros e leves: frutas, vegetais, cereais, leguminosas e frutos secos. Rajásicos são os mais energéticos: feijões, queijos de cabra ou muito curados, algas, chocolate, cebola e alho. Tamásicos são os alimentos fermentados e muito elaborados: todo o tipo de carnes vermelhas (contém muitas toxinas), frituras, pastéis, pão branco, álcool e todo o tipo de estimulantes. Gorduras e açúcares em excesso são prejudiciais para as células e para os tecidos do corpo. Quando circulam no sangue danificam as proteínas, causando muitos problemas para o organismo. Estas qualidades, sattva, rajas e tamas têm correspondência com o nível de tendências ou gostos que definem o carácter do ser humano. A individualidade é composta destes três guṇas.

Segundo a Bhagavad Gītā, Sattva corresponde à Harmonia, Rajas ao Movimento e Tamas à Inércia.
Sattva é o aspecto ascendente da energia ou vibração mais elevada. Representa um impulso da luz no domínio do pensamento, altruísmo, bondade, paciência, fé, coragem e determinação. Designa o contentamento, calma mental e a realização espiritual. Sattva reflecte o Ātman, o Espírito do homem.

Rajas representa o movimento, o poder de projecção donde provém toda a manifestação da energia de vida. É o causador do impulso para o mundo que causa ataduras. Tamas é o poder obscurecedor e representa o Ser e o universo, submetido ao aspecto inferior fenoménico que provoca a ilusão, a ignorância e a inércia. Desta forma, a purificação, a regeneração e a depuração do organismo pode ser obtido por uma escolha na qualidade alimentar, onde diariamente, através de um acto tão natural como comer, podemos melhorar, cada vez mais, as nossas capacidades intelectuais, emocionais, motoras e mentais. Preservar a saúde passa pela nossa responsabilidade de assegurar um organismo capaz de responder às nossas próprias necessidades, fornecendo-lhe os elementos necessários como as vitaminas, as proteínas e os minerais, como também, ao fortalecer a mente através da Meditação capacitamo-nos a enfrentar melhor os desafios constantes da vida, seja nas crises ambientais (desastres ecológicos) seja no trabalho, na sociedade, na família ou em nós próprios.

Contrair hábitos saudáveis, resulta numa qualidade de vida. Esta qualidade de vida, contrariamente ao pensamento comum mais materialista, não é obtida pelo dinheiro nem pelo poder consumista, mas, pela sensata forma de acção, onde até a simples nutrição, constitui por si só, um bem-estar.

Para tal é necessária uma boa dieta – alimentação cuidada.
Exercício – caminhar, fazer yoga ou outras modalidades, não violentas ou agressivas.
Jejum – uma vez por semana.
Meditação – prática assídua.

O Jejum
No jejum, estando o organismo liberto da digestão, o fígado na sua função natural, produz glicose e envia a todo o corpo, no qual o cérebro recebe uma boa percentagem. Esta reserva no fígado dura algumas horas (24h), período em que o organismo vive das suas próprias gorduras e proteínas, fornecendo energia às células. Entretanto, a composição do sangue, hormonas, neurotransmissores e subprodutos sofrem transformações químicas, permitindo que o organismo se regenere. Desta forma, é permitido ao cérebro readquirir o seu ritmo normal, sobressaindo então, um estado de acalmia mental. Esta reacção biológica, que resulta da supressão dos alimentos, liberta o corpo das tensões emocionais e energéticas, libertando a mente, que liberta simultaneamente, o coração. Daí advir não só a serenidade e clareza mental, como o amor se pode fazer sentir espontaneamente no coração, revelando estados mentais e espirituais latentes, como resultado da purificação corporal e mental.

Assim, para além dos efeitos do jejum no corpo físico, eles são sentidos especialmente nos corpos mais subtis e espirituais. Ao diminuir a carga física que o alimento comporta, libertando todos os órgãos que elaboram a digestão, repercute-se nos corpos subtis, que libertos das tensões corporais e mentais, acolhem maior fluxo da Consciência, devolvendo ao Ser a sua própria identidade. A mente clarificada pela purificação alimentar, fica no seu estado puro e natural, podendo, de facto, receber com maior força o poder e o amor do seu próprio Espírito.

Na realidade, esta leveza do corpo, permite viver mais conscientemente nos corpos espirituais ou subtis, principalmente no corpo búdico (buddhi), o corpo da consciência perceptiva ou sensorial (a Consciência pura livre dos condicionamentos do eu) e, fazer maior integração na Consciência Suprema, sem entraves, podendo atingir estados naturais de felicidade interior, que nos seres mais avançados espiritualmente, pode vir a realizar-se um Samādhi. Buddhi pode entender-se como Consciência superior, nível ou estado donde procede o mundo ideal ou primordial. A mente é composta de elementos subtis, que não sendo matéria faz a ponte entre a matéria, o corpo físico e o corpo subtil ou buddhi, sendo este por sua vez, composto de elementos refinados e puros onde habita a Consciência. É o que está no mais íntimo do ser humano; é o centro da Consciência, é o verdadeiro Conhecedor.

Concluindo, deste repouso do organismo (pelo jejum) que se reflecte a todos os níveis, emerge a capacidade de maior concentração da mente, pela qual se entra mais facilmente em Meditação. Contudo, convém não esquecer e, como factor fundamental, que num dia de jejum, deve haver recolhimento para que não se dispersem as energias, principalmente através da fala e de acções desnecessárias, motivos que podem levar a mente a grande dispersão e o resultado do jejum fica subvalorizado. Sem uma purificação da mente não há verdadeiro entendimento. Sem uma decisão correcta, não pode haver uma acção correcta. Quem pode conservar uma boa saúde, se não há moderação e domínio de si mesmo?

Como evitar o stress
Se algo simples e natural existe com efeito terapêutico para atenuar uma enfermidade, é sem dúvida o parar: ajustar o ritmo, o rumo e as prioridades. Mesmo que o silêncio ou a inacção pareçam uma fuga ou uma ociosidade, parar é curativo por si mesmo. A simples contemplação de uma paisagem ou uma imagem de devoção poderá constituir um passo para a cura.

A paragem ou o abrandar do ritmo de vida é a forma de acabar com o stress tão prejudicial à saúde. O stress pode ser provocado, não só por acções em demasia, exagerado movimento, como pela necessidade de resolver muitos problemas em simultâneo, dispersando a mente, mas também, pode ser causado pela inacção e pela expectativa, causando ansiedade e finalmente a depressão. Na base do stress está uma hormona, a cortisona, e a produção (concentrada) excessiva de cortisona pode danificar certas estruturas cerebrais e afectar determinados neurotransmissores.
Assim, o parar, pode por si só debelar uma doença, pois a energia poupada (recuperada) no repouso pode fluir por todo o organismo beneficiando os órgãos mais necessitados, devolvendo-o à normal funcionalidade.

Parar, olhar para si mesmo! Contudo é bom que se aprenda a fazê-lo, antes mesmo de vir a contrair alguma doença, porque senão, será a tal obrigado, infelizmente quando ela já se instalou; nesse caso, só resta na realidade, assumir a melhor atitude frente à divina Providência, que impõe mesmo a paragem e a reflexão forçada, condicionantes que levam, a tomar nova direcção quer interna quer externa. Adoptar formas positivas de viver, de pensar e de agir connosco e com os outros, crença devocional ou fé religiosa, ajudam à cura de muitas doenças ou podem mesmo preveni-las. Recentes investigações na área da neurociência revelam, que existe um circuito no nosso cérebro que se activa quando acreditamos que uma terapia vai resultar, remetendo neste caso, a cura de uma dor ou de uma doença para uma fé e confiança espiritual, tendo este circuito cerebral, propriedades positivas para a saúde.

Felizmente, na área da medicina e por meios de observação, já se chega a conclusões tão importantes como as do âmbito religioso e espiritual, que só vêm confirmar o que há centenas, senão milhares de anos, ensinam os filósofos, metafísicos e religiosos da Índia sobre a via do auto-conhecimento e da evolução espiritual consciente. É dentro de sistemas de Yoga, como por exemplo, o de Patañjali ou ainda do mais metafísico, o Advaita Vedānta, que se assegura, que o melhor desempenho e felicidade vêm quando usamos correctamente a mente, onde o cérebro faz o seu trabalho natural, proporcionando saúde e equilíbrio e, quando faz o contrário, surge o desequilíbrio e a doença.

As pessoas com valores altruístas, sentimentos de fé, ou algo que apele e inspire à ligação com a Transcendência, desenvolvem naturalmente a devoção; a devoção desenvolve o amor universal e o amor provoca bem-estar ou felicidade interna, sendo esta uma fonte para a saúde. Direccionar-se por entre valores superiores (finalidade humana), ajuda o próprio cérebro nas suas funções neuronais, ou levam a novas ligações que beneficiam áreas importantes, desencadeando o bem-estar físico, mental e espiritual pela atitude positiva no viver, que gera, por sua vez, equilíbrio e confiança. Este é o caminho certo para manter a saúde. O cérebro é um órgão em constante mutação (evolução), muda e é moldado com as experiências ao longo de uma vida.

O simples rumor de água deslizando, o som do bater das ondas ou as formas inspiradoras das nuvens ondulantes, também podem contribuir para estabilizar a saúde. O contemplar da própria Natureza, tem o poder de acalmar a mente e o coração, predispondo espontaneamente para a paragem da acção física e mental. A cada instante podemos usufruir da quietude da Natureza se prestarmos atenção ao seu murmurar, seja na melodia dos pássaros ou no ecoar de folhas levadas pelo vento; o importante é escutar, dar atenção, concentrar a mente nesse algo que nos chama. O perfume de uma flor pode ter o mesmo efeito de evocar serenidade.

Segundo as estatísticas, 15% da população ocidental sofre de depressão. Poderá, eventualmente, um indivíduo nascer com uma propensão genética, mas para além do meio ambiente em que se nasce, cultura e educação, ela pode ser diminuída ou aumentada. Na realidade, a depressão pode instalar-se em qualquer pessoa desde que não cumpra o seu objectivo de vida (ou transfira graves perturbações de vidas passadas), que por esta falha se instala o vazio: a falta de alimento da Alma.

Naturalmente, cada um tem o seu próprio objectivo de vida a cumprir, que passa inevitavelmente pela evolução espiritual consciente. Se por negligência, ambiente dispersante ou perversão se desvia deste propósito, que é o seu cumprimento espiritual, razão última desta manifestação de vida, o próprio cérebro não faz as ligações neuronais para o qual vem programado, e ao ficar com uma insuficiência, falha todo o sentido da vida. Isto ressente-se a todos os níveis, abrangendo a mente-consciência que pela falta de motivação entra em melancolia e com o passar do tempo se traduz por depressão.

Também, ao não se assumir como um Ser responsável e ao não aceitar, até inconscientemente, as suas condições cármicas, seja com os familiares, amigos e a sociedade onde se insere, causa rebeldia interna que dificulta esse assumir, sobressaindo então os problemas psíquicos, que acabam por ser diagnosticados como depressão e a seguir vêm os fármacos em socorro daquilo que sería tão simples e natural de resolver. A depressão não passa de um mal espiritual, infelizmente, uma carência que atinge grande parte da humanidade: que é a ausência de ligação com o seu próprio Eu e com o Divino.

O valor da Meditação na saúde.
Também a ciência chega à conclusão de que a Meditação pode curar doenças, nomeadamente a hipertensão, um dos factores de risco da vida moderna para a saúde mental e para o equilíbrio nervoso central. A Meditação ainda reduz o risco de doenças cardiovasculares, como reduz também a possibilidade de vir a sofrer de problemas cerebrais. Será assim tão difícil preservar a saúde?
Prevenir doenças passa por conhecer as causas que a elas levam. Sentar a meditar numa posição confortável e concentrar a mente é o meio pelo qual assenta a estabilidade física, mental e emocional (a maior parte das doenças são causadas pelas emoções excessivas); o ritmo cardíaco abranda, a respiração acalma, a energia ou prāṇa flui pelos canais internos desbloqueando tensões acumuladas nos centros nervosos, permitindo, lentamente, ao organismo começar a trabalhar a um ritmo normal, regenerando-se. Este é o ponto fundamental. A Meditação, desenvolve a consciência, pois passa pela vontade e pelo conhecimento de que a prática é para determinado fim, dando esta paragem do corpo e da mente oportunidade ao organismo de se regenerar, revigorar, depurar.
São estes requisitos, essenciais para manter a saúde.

Podemos resolver problemas ou nem mesmo chegar a tê-los, desde que sejamos conscientes de que o nosso corpo é o nosso templo e que devemos mantê-lo em bom funcionamento, pois a falta desta consciência barra todo o caminho do equilíbrio. A base para a saúde assenta na mente, já que é a forma como nos comportamos com nós próprios, que pode gerar, ora conflitos internos desagradáveis, ora instantes de felicidade, estados que vão influenciar os meios onde nos movemos, repercutindo-se infalivelmente no convívio com os outros. Se por uma paragem nas nossas acções, nos nossos movimentos, formos levados a repousar, a relaxar, a contemplar e a meditar, estamos a assegurar maior equilíbrio psíquico e físico e, ainda mais profundamente, se adicionarmos a componente espiritual.

Espiritual é aquele estado que resulta da busca pela realização consciente de si próprio, do seu Eu Supremo; o fio condutor para a iluminação e que leva à Unidade no Absoluto, onde se encontra a causa e a finalidade desta vida na Terra. Esse será sem dúvida, o grande impulso para alcançar o objectivo, de forma consciente, para o aperfeiçoamento das nossas capacidades humanas: mais Consciência, mais Inteligência, mais Amor, mais Alegria e mais Saúde.
   


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Impresso em 28/3/2024 às 13:17

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