Fundação Maitreya
 
A Angélica e os Óleos Essenciais

de Eduardo Novo

em 21 Mai 2007

  As plantas aromáticas e medicinais, foram desde tempos imemoráveis um meio privilegiado para a obtenção de substâncias elaboradas, que ultrapassavam, pela sua complexidade, os conhecimentos empíricos de Químicos e Alquimistas. Com o avanço dos tempos, a evolução da química permitiu a síntese parcial ou total em laboratório, de substâncias idênticas àquelas que a mãe Natureza oferece.


As plantas aromáticas e medicinais, foram desde tempos imemoráveis um meio privilegiado para a obtenção de substâncias elaboradas, que ultrapassavam, pela sua complexidade, os conhecimentos empíricos de Químicos e Alquimistas. Com o avanço dos tempos, a evolução da química permitiu a síntese parcial ou total em laboratório, de substâncias idênticas àquelas que a mãe Natureza oferece.
Não obstante todo o progresso e as capacidades da ciência para produzir sucedâneos de qualidade, parece existir sempre um embaraço no que respeita à verdadeira valorização utilitária das plantas aromáticas e medicinais. Este interesse tem assumido cada vez mais importância, tendo em consideração a referida complexidade e diversidade das substâncias obtidas a partir das diferentes espécies vegetais e a actual atracção do público pelos produtos naturais. Por fim, podemos mesmo constatar que grande parte das substâncias naturais se obtêm, em alguns casos, a preços menos elevados, beneficiando até geralmente, de um ambiente jurídico mais flexível em relação às novas substâncias sintéticas.

No entanto, mesmo assim, assiste-se a uma regressão da utilização do natural em sectores como a perfumaria, frequentemente devido aos preços que chegam a ser atingidos. Com efeito, o mercado das plantas aromáticas e medicinais sofre contrariedades e pressões que o fragilizam como o carácter imprevisível das colheitas, os custos de exploração e mão de obra elevados (recolecção de plantas selvagens; produção agrobiológica; etc.), flutuação dos preços de produção e respectiva comercialização, falta de pureza e de reproductibilidade do vegetal em extractos naturais, rendimentos por vezes insuficientes das variedades cultivadas.
Dentro deste prisma, o trabalho do agrónomo pode permitir desenvolver os procedimentos necessários, visando a redução das fraquezas do vegetal, com as quais os utilizadores são confrontados no decorrer da sua exploração. Assim, é possível o melhoramento, entre outros, do rendimento, da capacidade em fornecer um produto de melhor qualidade, da resistência aos agentes patogénicos,da utilização de novas técnicas culturais e de esquemas de selecção adaptados.
Tendo em conta o actual mercado internacional em que se avista toda uma série de dificuldades inerentes ao desenvolvimento do sector das plantas aromáticas e medicinais, sem dúvida há que promover um esforço na medida em que se abram novas perspectivas tanto no que diz respeito à saúde, à alimentação, a novos postos de trabalho, enfim, a uma melhoria da qualidade de vida das populações humanas, não só nos países industrializados mas também naqueles que se encontram em vias de desenvolvimento, como resultado da sábia gestão dos nossos recursos naturais, canalizando assim formas alternativas mais sustentáveis na organização do nosso meio rural.

Nota histórica

Utilizadas para diversos fins, desde sempre que as plantas aromáticas e medicinais foram consideradas com a mais alta estima pela humanidade, conservando um lugar fundamental ao longo de toda a sua existência. O facto revela-se acima de tudo como um dos elos mais significativos e directos entre o homem e a sua própria Natureza, o mistério oculto da Criação, com o qual ele sacramente comunicava com fé, através do culto de rituais sagrados (Eliade, 1949). Inerente a todo um conjunto de práticas e terapêuticas, sempre existiu um espiritualismo, uma mística onde o "Xaman", "medecine-man", curandeiro, feiticeiro, Homem Santo, entre outros (Brelet-Rueff, 1991), conjugava a sabedoria, o conhecimento empírico das propriedades das plantas e o uso da magia (Stobart, 1982), tanto em rituais sagrados como em práticas de medicina tradicional.
Com o advir dos tempos, o Homem foi desenvolvendo as técnicas de utilização das plantas e o respectivo conhecimento terapêutico. Em toda a sua evolução podemos encontrar quatro grandes épocas (Franchomme, 1990). A primeira, aquela em que, o homem utilizou as plantas tal e qual no seu estado primário sobre a forma de infusões e decocções. A segunda, aquela em que as plantas aromáticas eram queimadas ou utilizadas em infusão ou maceração em óleo vegetal. Nesta época existia, a noção de actividade ligada à substância odorante. Durante a terceira época manifesta-se a investigação sobre a extracção dessa substância odorante. Nasce assim, o conceito de óleo essencial que induz à criação e ao desenvolvimento da destilação. Por fim, o período actual, no qual intervém o conhecimento dos constituintes químicos dos óleos essenciais, explicando as actividades físicas, químicas, bioquímicas, terapêuticas e electrónicas dos aromas vegetais.

Os três grandes berços da civilização aromática, a Índia, a China e a bacia mediterrânea legaram-nos os procedimentos e conhecimentos que ainda hoje se nos demonstram válidos. Um alambique em barro foi descoberto no Paquistão remontando a 5000 anos antes da nossa era (Franchomme, 1990), mas foi no Egipto, entre 3000 e 2000 a.C., época em que era utilizado um processo rudimentar de destilação, que o uso das plantas aromáticas teve um desenvolvimento crucial. Os Persas, 1000 anos antes da nossa era, parecem ter sido os "inventores" da destilação propriamente dita. Abdalá Ibn Sinâ (980-1037) conhecido como Avicena, célebre médico e filósofo iraniano, mais tarde cognominado o Príncipe dos médicos, melhora a técnica e produz o primeiro óleo essencial puro, utilizando a Rosa centifolia.

Os Gregos fizeram um largo consumo de substâncias odorantes naturais e diversas obras foram escritas para louvar e elogiar as suas propriedades, indicando as melhores regiões de produção. Hipócrates, "o pai da Medicina" indica, nos aforismos que lhe são atribuídos, a utilidade dos banhos aromáticos no que respeita ao tratamento das doenças da mulher. Em Atenas luta contra as epidemias, particularmente a peste que assola a cidade, fazendo queimar alfazema, alecrim, hissopo e muitas outras plantas aromáticas. Mais tarde desenvolve-se uma utilização mais sistemática dos aromas na Grécia, principalmente sobre a forma de massagem. Teofrasto, autor do "tratado dos odores", frisa o interesse terapêutico dos perfumes e observa os princípios fundamentais de acção dos óleos essenciais sobre os órgãos internos, chegando mesmo a indicar os perfumes convenientes a cada parte do corpo da mulher, para enaltecer a sua beleza.
Pédanius Dioscórides redige, no primeiro século da nossa era, uma obra de fitoterapia, contendo numerosas plantas aromáticas. Este livro constituirá uma referencia para toda a medicina ocidental durante um milénio. Origanum majorana e outros Origanum, Thymus serpyllum e outros Thymus, Rosa damascena, Ocimum basilicum, etc., eram conhecidos e correntemente utilizados nessa época.

Os Romanos legaram-nos o conhecimento das propriedades terapêuticas dos óleos essenciais, transmitidas e "refinadas" desde Dioscórides.
Por sua vez os Árabes permitiram um melhoramento considerável da química e da destilação. Eles produziram variados perfumes, particularmente em Damas.
A importância da utilização de especiarias e extractos aromáticos no ocidente desde a idade média, deve-se sem dúvida em grande parte às cruzadas que permitiram aos cruzados disseminarem a arte da destilação. De facto a tradição alquímica, integrando a distilação, estava deveras enraizada em país muçulmano. Os melhores estudos da época sobre plantas aromáticas são realizados por alquimistas, praticando uma livre investigação e aprofundando os conhecimentos legados pelos antigos.
No fim do séc. XVI, começo do séc. XVII, mais de 100 óleos essenciais são utilizados para tratar problemas precisos com base no conhecimento desenvolvido. É igualmente nesta época que se desenvolve a produção de águas florais das quais algumas ainda hoje são comercializadas nos nossos dias, como é o caso da água de "Mélisse des Carmes", produzida por volta de 1600.

Com o advento da civilização industrial o campo de utilização das plantas aromáticas e óleos essenciais tornou-se vastíssimo. Hoje em dia podemo-los encontrar em diversos ramos como a farmacêutica, perfumaria, alimentação, confeitaria, fitoterapia, aromaterapia, homeopatia, cosmética, enfim, todo um leque de utilizações à mercê de um mercado e de uma cultura em constante evolução.

Angélica

2.1. Etimologia/ Origem
O nome angélica provém da importância das suas virtudes consideradas divinas. Na verdade, angélica vem do grego Angelos, anjo anunciador, pois segundo conta a lenda, ela foi revelada pelo anjo Rafael e oferecida como um presente mágico para curar a peste. Esta planta foi durante muito tempo rodeada de considerações místicas e na idade média, associavam-na às festividades pagãs contra a bruxaria, a feitiçaria e para eliminar o veneno do corpo humano.

É uma planta bianual, originária das regiões setentrionais (fig 1). Os habitantes dos países nórdicos, utilizavam as suas raízes e a parte aérea (fig. 2) várias centenas de anos antes de ela ser conhecida na Europa central. Encontram-se especialmente documentos históricos noruegueses indicando que os camponeses eram encorajados a cultivá-la desde 1164. Depois, só no século XIV é que a planta chega à Europa central e que é utilizada, principalmente, contra a peste.

2.2. Utilizações
Todas as partes da planta podem ser utilizadas. Até ao século XVIII verifica-se mais o seu uso medicinal do que alimentar, de seguida encontramo-la em domínios bastante diversos.
O principal emprego dos pecíolos era na confeitaria e doçaria onde são cada vez menos utilizados. As folhas frescas são utilizadas em ervanária e, em certos países, servem para aromatizar em cozinha e também bombons. As diferentes partes da planta entram também directamente na preparação de certas bebidas. O óleo essencial das raízes e frutos é utilizado como aromatizante na Bénédictine, no Vermouth, na Grande Chartreuse, em alguns gins, mas também em perfumes com nota masculina (Poucher, 1991), nos cremes, sabões, bálsamos, shampôs e como agente de sabor no tabaco. Do ponto de vista medicinal, a planta é estomáquica, estimulante, antiespasmódica e carminativa. O seu óleo essencial é utilizado em aromaterapia onde se reconhecem as suas propriedades sedativas, carminativas, anticoagulantes (Franchomme, 1990).

Esta planta foi já utilizada em tratamentos de doenças nervosas, de insuficiência respiratória, e nos Estados Unidos para deixar de fumar. Mais recentemente em 1985, (Reduron, 1995) cita as propriedades da felandrina (diminuição da actividade surrenale, anti-inflamatório, antiestrogénio) e das coumarinas que inibem o crescimento das células cancerosas Hela S3 (Bernard, 1991).

2.3. Resumo sistemático (Gaussen, 1982)
Divisão : Angiospermicas
Classe : Dicotiledonea
Sub-Classe : Rosidae
Ordem : Apiales
Família : Apiaceas (umbeliferae)
Género : Angelica
Espécie : Angelica archangelica
Sub-Espécie: Angelica archangelica subesp. archangelica

2.4. Nomes vernaculares e sinónimo
Alemão:Engelwurz, Angelika, Erzengelwurz, Garten-Engelwurz, Heiliggeistwurzel
Basco: Aingeru-belar
Dinamarquês: Sloke, Ouanne
Espanhol: Angélica, Ajonjera, Carlina, Hierba del Espírito Santo
Francês: Angélique, Herbe aux anges, Herbe du Saint-Esprit, Herbe à
la fièvre, Archangélique, Racine du Saint-Esprit
Galego: Anxélica
Inglês: Angelica, Longwort, Garden Angelica, Holyghost
Italiano: Angelica, Angelica domestica, Arcangelica
Polaco: Dziegiel
Português: Angélica, Angélica da Boémia, Angélica dos Jardins, Erva do Espírito Santo, Raíz do Espírito Santo
Russo: Djajilnik
Turco: Melaik otou

2.6. Biologia

2.6.1. Botânica
A angélica, Angelica archangelica subsp archangelica pertence à importante família das Apeacea, anteriormente chamada Umbelliferae. Esta família caracteriza-se segundo a Flora Europeae (Tutin, 1968) por um caule canelado, um limbo dentado, uma folha penatissecta (fig. 3) e uma inflorescência constituída de uma ou várias umbélulas compostas (fig. 4). O fruto seco é um diaquénio donde as duas unidades se separam à maturação (fig. 5). Cada aquénio é munido de cinco lados longitudinais primários e o espaço entre dois lados, contém frequentemente, um a quatro canais secretores de óleo essencial.

Segundo Franco (1971), são ervas, raramente arbustos. Com folhas alternadas, limbo geralmente grande e uni-multissecto; pecíolo frequentemente dilatado e invaginante na base.
Esta família possui numerosos géneros dos quais as espécies são importantes pela sua utilização, tanto como condimento (alcaravia, salsa, coentro, cominho), como legumes (cenoura, aipo), como plantas medicinais (angélica, coentro), ou como aromatizador de licores (anis, funcho).

2.6.2. As espécies do género Angelica
Conhecem-se até à data 50 a 80 espécies deste género (Reduron, 1995), dentre as quais A. palustris (Besser) Hoff. ; A. heterocarpa Lloyd; A. razulli Gouan; e A. sylvestris L que se desenvolvem em França (Bernard, 1991), mas sem grande importância económica. Àparte destas espécies, encontramos a A. archangelica (fig. 5) da qual as principais características são:
Planta aromática, robusta, monocárpica alcançando 1 a 2m. Caule verde, por
vezes com coloração vermelha, oco, estriado, produzindo um látex quando cortado. Folhas bi-tri penatissectas (2 ou 3 recortes em folíolos largos), glabras, elípticas, com a divisão terminal geralmente trilobada e frequentemente decorrente; margem foliar fortemente dentada; ápice mais ou menos incurvado; folhas caulinares. Umbélulas hemisféricas compostas por cerca de 40 raios, pubescentes; pedúnculos glabros. Flores esverdeadas, amareladas ou esbranquiçadas. Sépalas reduzidas a dentes extremamente curtos. Fruto liso, de 6 a 9 mm de comprimento, subparalelipeptídico (Tutin et al. 1968), cada mericarpo comprimido sobre o verso (ou o dorso), não possuindo senão extremidades primárias de onde as três dorsais são espessas e as duas marginais transformadas em asas membranosas. Número de cromossomas 2n=22 (Ojala, 1995).

III : Da Essência ao Óleo Essencial3.1.

Definição de essência e óleo essencial
Segundo a norma portuguesa NP-90 (1987), designam-se por óleos essenciais:

1) Os produtos aromáticos obtidos por destilação pelo vapor de água, de matérias vegetais de origem botânica determinada ou por expressão do pericarpo dos citrinos, e separados da fase aquosa por processos físicos;
2) Por alargamento, outros produtos aromáticos obtidos a partir de matérias vegetais, por outros processos de destilação ou por destilação fraccionada, ou submetidos durante a sua preparação a tratamentos auxiliares tais como a filtração, a centrifugação, a rectificação, o tratamento por adsorventes, por concentração selectiva ou por eliminação de certos constituintes.
Por matérias vegetais designam-se não apenas as partes estruturais de plantas, mas também os exsudados, os extractos por solventes e os produtos pirogenados.

Também conforme a norma francesa NF T 75-006 difundida pela AFNOR (Associação Francesa de Normalização), óleo essencial é classificado como produto volátil inserido em produtos derivados, definindo-se como:

Produto obtido a partir de uma matéria prima vegetal,
- seja por arrastamento a vapor,
- seja por processos mecânicos a partir do epicarpo dos Citrus,
- seja por destilação a seco.

Sendo o óleo essencial de seguida separado da fase aquosa por processos físicos.
No entanto há ainda que considerar a diferença de definição entre essência e óleo essencial. Segundo Franchomme (1990) "à saída do refrigerador (com circulação de água fria), no qual se condensam os vapores, a água destilada e a essência (mais ligeira que a água) transformada em óleo essencial, separam-se no vaso florentino (separador) (ver Anexo II). Esta mudança de apelação justifica-se plenamente uma vez que, sob a acção do oxigénio, da água, do vapor de água e da temperatura, as moléculas aromáticas da essência sofrem diversas modificações (oxidações, hidrólises, restruturações) mínimas em certos casos, importantes noutras. Assim por exemplo, a essência das folhas de Satureja hortensis, analisada por captação directa (com a ajuda de um aparelho especializado) contém muito pouco de carvacrol, mas por sua vez o óleo essencial já é particularmente rico nesta substância química."

3.2. Propriedades físicas das essências e óleos essenciais

As essências e óleos essenciais tem propriedades físicas comuns, variando no entanto em função dos seus constituintes. À temperatura ambiente são líquidos, raramente viscosos (mirra, etc.) ou cristalizados; com uma temperatura mais baixa podem cristalizar parcialmente ou totalmente (anis- anetol, menta dos campos- mentol, Thymus satureioides- borneol, etc.); raros são aqueles que solidificam com o frio (Tanacetum annuum- camazuleno) (Franchomme, 1990).
São voláteis, o que os opõem aos óleos gordos; essa volatilidade é por sua vez a origem do seu carácter odorante e permite o seu arrastamento pelo vapor de água.
São mais ligeiros que a água e não miscíveis, o que permite a sua separação no vaso florentino (separador) acoplado ao alambique. No entanto alguns óleos essenciais tem uma densidade superior à da água como é o caso do ssassafrás, do cravinho e das sementes de cenoura. Normalmente são muito pouco solúveis em água, o que não impede que alguns compostos sejam mais solúveis do que outros ( verbenona do alecrim, lavandulol da alfazema, etc.). Por outro lado são totalmente solúveis nos óleos gordos ( os melhores solventes dos óleos essenciais) como óleo de girassol, amendoim, cártamo, grainhas de uva, amêndoas doces, e particularmente solúveis em álcoois e solventes orgânicos.

3.3. Biossíntese

As essências vegetais são elaboradas pelas plantas aromáticas no seio de células secretoras. A sua elaboração é totalmente tributária da radiação solar sem a qual o rendimento em princípios aromáticos e mesmo a sua natureza seriam afectados. Na sua presença, e particularmente em função da predominância desta ou daquela radiação, os tipos de compostos poderão variar consideravelmente dentro de uma mesma espécie (Franchome, 1990).
As duas principais vias no que respeita à produção das essências são a via dos terpenoides (a mais comum e representativa) e a via dos fenilpropanoides. A secreção das substâncias conduzindo ao óleo essencial, ocorre na planta em estruturas que são extra celulares, afim de evitar todo o contacto tóxico (Bernard, 1991). Os locais de acumulação são também os locais primários de síntese dos terpenos, bem que essa biossíntese se faça por sua vez em cavidades de secreção glandular, em células especializadas ou em associação com glândulas particulares.

3.4. Localização das células secretoras isoladas ou organizadas em
glândulas

As estruturas glandulares (e as células secretoras isoladas) podem se encontrar em todos o órgãos vegetais, vegetativos e reprodutores: sumidades floridas, frutos, raízes.
Raras são as plantas em que as suas estruturas estão presentes num só órgão; a maioria possuem-nas em todas as suas partes; é o caso da Angelica archangelica (raiz, caule, folhas, flores e frutos), e bem que a composição das essências de cada uma das diferentes partes seja diferente uma da outra, todas guardam um traço comum.
O óleo essencial da Angélica normalmente está contido em formas chamadas canais secretores. Estes canais secretores não possuem paredes próprias e teriam tido por origem uma lacuna no seio do parenquima donde as células vizinhas se diferenciàrão em células secretoras (Bernard, 1991).
No que respeita à parte subterrânea, Chalchat e Garry (1992) precisaram que o teor de óleo essencial é máximo na raiz (0,45%), e bastante fraco nas radículas e na parte suberosa (0,33 e 0,17%). As radículas e a parte suberosa seriam portanto, respectivamente 27 e 62% menos ricas que a raiz. Nesta explicação, as diferentes partes do sistema radicular parecem estar mal definidas e por outro lado, a parte suberosa não deveria conter óleo essencial uma vez que corresponde a tecidos mortos e sem canais secretores.(figura de cortes histológicos).

3.5. O ternário aromático

A percepção do "ternário aromático", advém da prática medicinal quotidiana em aromaterapia e da experiência de ensino francófono e anglófono.
De facto, se é certo que as essências e, por conseguinte, os óleos essenciais são substâncias químicas que não escapam de forma alguma à realidade atómica de toda a substância material, também é certo que elas não se limitam simplesmente à matéria.
Segundo Franchomme (1990), para além dessa realidade estritamente material, elas são igualmente vectores de energia que se assume e se transforma sob a forma de cargas electromagnéticas apelidadas "charges portées". Para além disso, estabelecendo uma relação directa com o seu ambiente, os aromas são igualmente mensageiros portadores de informações.

Sendo assim, as substâncias aromáticas adquirem três facetas particulares:
- o conteúdo molecular
- o potencial energético
- o aspecto informativo

A título de exemplo, se um determinado óleo essencial for objecto de prescrição médica, a sua penetração no organismo representará não só uma doação de moléculas (aspecto material), mas também uma doação bioelectrónica (aspecto energético). Este segundo aspecto não corresponde à energia "calórica" como aquela que é promovida pelas moléculas nutritivas, mas a uma actividade eléctrica, seja por excesso de electrões (actividade negativante) como no Cymbopogon citratus ou por falta de electrões (actividade positivante) como é o caso do Thymus satureioides, quimiotipo borneol (Franchomme, 1991). De seguida, levando o óleo essencial às narinas, a quantidade de matéria-energia recebida pelo organismo corresponde a uma ínfima fracção proveniente da volatilização de algumas centenas de moléculas. Mas o simples encontro destes traços com a zona olfactiva, capaz de os transformar em impulsos nervosos conduzidos até ao sistema cerebral de percepção, despoleta uma série de reacções em cadeia, por vezes consideráveis. Portanto, paralelamente à acção material ponderal e à actividade energética do óleo essencial, surge uma informação-circulante no organismo que lhe reage.

3.6. Processos de extracção
Os óleos essenciais são obtidos em laboratório, por hidrodestilação (3 horas para a Angélica, com um débito de 2 a 3 ml por minuto conforme a Farmacopeia francesa). Na industria, os óleos essenciais podem ser obtidos por hidrodestilação ou por destilação a vapor. De facto, a hidrodestilação põe em contacto o material vegetal com a água, o que já não se passa com a destilação a vapor, onde o material vegetal é atravessado por uma corrente de vapor arrastando consigo grande parte da essência, originando assim o óleo essencial (Anexo II).
Fracções idênticas ou mais importantes ainda podem ser obtidas por extracção a CO2 supercrítico. Na realidade, este processo, a 60º C e 60 bars, dá um produto que será comparável ao óleo essencial obtido por destilação a vapor, e a pressões mais significativas permite a extracção de compostos mais pesados (resinoides). Esta técnica, segundo Pellerin (1986), disponibiliza um produto com uma qualidade mais fiel à própria essência original.

3.7. Composição química

As plantas aromáticas contêm entre outros, os três tipos de elementos seguintes:

- compostos voláteis que podem ser recuperados na forma de óleo essencial por hidrodestilação,
-compostos não voláteis (óleoresinas, resinóides) que podem ser extraídos
por solventes apropriados ou por extracção a CO2 supercrítico,
- matéria inerte, principalmente constituída por celulose.

Presume-se assim, que a composição do óleo essencial varia conforme o processo de extracção utilizado. Os rendimentos são frequentemente superiores em extracção a CO2 supercrítico com relação à hidrodestilação e à destilação a vapor, pois esta técnica permite a obtenção de compostos que a destilação a vapor não consegue extrair. Em contrapartida, esta última induz no produto certas notas particulares que podem interessar ao utilizador. Com efeito, reacções como as de Maillard (Tressl, 1993) podem transformar diversos compostos durante a distilação, mudando assim o aroma e a fragrância das essências obtidas. Os produtos resultantes da acção do solvente sobre as raízes da Angélica são também de natureza diferente. Por exemplo, as extracções com pentano efectuadas por Chalchat e Garry (1993), tinham por compostos principais as coumarinas.
De um ponto de vista quantitativo, Ojala (1986) assinalou que o óleo essencial de raiz de diferentes populações de Angélicas varia entre 0.3 e 1.1% da matéria seca. Para corresponder à Farmacopeia francesa, a quantidade de essência deve representar 0.2% da matéria seca no mínimo desde Janeiro de 1996 (a norma era de 0,4% antes dessa data).Para além disso, ele constactou que a quantidade de óleo das raízes flutua ao longo de todo o ciclo da planta.

Os estudos de Ojala (1986), conduzidos sobre o óleo essencial de Angélica obtido
Forsen (1979) descobriu que as proporções de felandrina variavam com a idade da planta.
Ojala (1986) por sua vez demonstrou que as variações em proporções dos diferentes terpenos podem-se traduzir por morfologias distintas e que a composição do óleo essencial de um ano sobre o outro, no seio de uma mesma espécie, mantém-se estável.

3.8. Função

Os óleos essenciais são metabólitos secundários, ou seja produtos químicos caracterizados por uma distribuição limitada e uma função indefinida ou pouco evidente no que respeita à fisiologia da planta produtora (Hay e Waterman, 1993). No entanto mesmo constatando que as moléculas aromáticas se situam no fim da cadeia metabólica, não será suficiente para as considerar como moléculas de segunda ordem.
Em certa medida, dentro de uma perspectiva estritamente molecular, os compostos aromáticos constituem para o vegetal uma reserva energética indispensável. Os indivíduos que efectuam a colecta sabem que em tempo encoberto o impacto odorífero da planta é menor, pois segundo Franchomme (1991), esta última reutiliza provavelmente os seus constituintes aromáticos voláteis para suprir a diminuição de actividade fotossintética logo que a necessidade se faça sentir. A reciclagem ocorre sob a forma de glucósido terpénico solúvel. A essência constitui portanto, com toda a evidência, uma reserva energética, um "concentrado solar" no seio do vegetal.
Por outro lado, no plano da biologia relacional (da planta com o seu meio), a essência representa uma "informação-circulante" de prima importância. Uma aura envolve a planta aromática, atraindo os amigos e repudiando os inimigos.

Que a cor e a forma têm uma importância apreciável na atracção exercida sobre os insectos polinizadores, já nós sabemos, mas temos que reconhecer que as exalações perfumadas que se espalham no ar são mais intensamente detectadas. As abelhas (que criadas na ausência total de odor, apresentam uma atrofia do seu sistema nervoso) (Franchomme, 1991) quando muito jovens, condicionadas a respirar geraniol, demonstraram quando libertadas, uma atracção preferencial rumo às flores que sintetizam e exalam essa molécula.
Ao contrário do aspecto positivo da vertente "sedução aromática", encontramos também, por um lado a fácies "negativa" pela repulsão dos "indesejáveis" (como no caso do Teucrium marum, produzindo iridodial, repulsivo para os insectos e os herbívoros), e por outro lado, a luta integrada contra os agentes patogénicos susceptíveis de pôr a vida da planta em perigo. Pois ela deve também providenciar um combate contra as agressões microbianas de qualquer natureza. Se os nossos amigos cogumelos conseguiram encontrar um modo de acção específica para se protegerem das bactérias (os antibióticos), os seres que possuem a clorofila evoluíram sobre um registro molecular mais diversificado e as plantas aromáticas chegaram ao ponto de sintetizar diversos milhares de compostos activos para dissuadir ou convencer os intrusos.

3.9. Toxicidade

Os óleos essenciais são substâncias extremamente activas. No entanto as moléculas aromáticas não apresentam todas o mesmo grau de toxicidade.
Diversos tipos de propriedades podem ser reconhecidas:

- Propriedades vesicantes e necrosantes
- Propriedades alergizantes
- Propriedades fotossensibilizantes
- Propriedades neurotóxicas
- Propriedades nevróticas
- Propriedades hepatotóxicas
- Propriedades carcinogénicas

No caso da Angélica, podemos encontrar furanocoumarinas e coumarinas responsáveis por diversas propriedades medicinais (Sethi, 1992) e por fotossensibilização em uso externo (Franchomme, 1991). A fotossensibilização não deve ser tomada de ânimo leve, uma vez que esta é susceptível de favorecer a carcinogénese.
Durante a prática da colheita das plantas no campo, notou-se que algumas das pessoas que entraram em contacto com as folhas apresentarão uma certa alergia cutânea devido precisamente à fotossensibilização provocada pelas moléculas aromáticas em exposição ao sol.
Portanto, aplicando as devidas precauções (abstenção de exposição solar nos dias seguintes à utilização do óleo essencial), estes óleos essenciais poderão ser úteis em muitíssimos casos.

3.10. A qualidade

Podemos considerar que os produtos de síntese química são substâncias mortas e por conseguinte perigosas, pois são perturbadoras dos sistemas metabólicos naturais vitais onde se acumulam e actuam em sinergia (Franchomme, 1991). Pela sua presença, o solo, as plantas, os animais, e por fim o homem, desvitalizam-se. Ao contrário, os óleos essenciais e as essências de expressão são produtos naturais que, utilizados para fins preventivos, curativos ou de bem-estar favorecem uma profunda revitalização do organismo.
Mas, infelizmente, por múltiplas razões, não é possível produzir verdadeiros óleos essenciais de elevada qualidade. As dificuldades são devidas principalmente à escassez de plantas sãs, à colheita das plantas selvagens que requer bastante tempo e uma mão de obra cara, e à pouca abundância dos produtos agrobiológicos que ainda se faz sentir, apesar dos esforços de certas organizações.
Por seu turno a destilação requer, segundo a antiga tradição, grandes precauções. Assim, a honestidade do mestre destilador deverá ser completada por uma competência a nível científico e técnico.

3.10.1. Especificação botânica

Segundo Roger Jollois (Franchomme, 1991), ao consultar diversas obras consagradas às plantas medicinais, constata-se definitivamente que cada planta ou seu respectivo óleo essencial eram susceptíveis de tratar uma grande quantidade de males. A origem dessa aberração deve-se acima de tudo às diversas imprecisões botânicas, e em seguida à lista das utilizações empíricas das plantas.
É necessário saber, por exemplo, que existem diversas centenas de espécies de eucaliptos, todos de nome comum eucalipto, mas donde as propriedades são mais ou menos distantes e por vezes mesmo opostas. A teoria fundamental de P. Franchomme (1990) é a aplicação de "chemotypes" ou raças químicas. No que concerne á espécie Thymus vulgaris, existe um certo número de raças químicas que respeitam esta espécie. Por exemplo, o Thymus vulgaris quimiotipo thymol é um poderoso anti-infeccioso mas apresenta uma forte dermocausticidade e uma não menos evidente hepatotoxicidade empregando-o durante um longo período; ao contrário o Thymus vulgaris quimiotipo tuianol, bem que igualmente anti-infeccioso, não é agressivo e mesmo estimula as células hepáticas (Franchomme, 1990).
As lavandas (Lavandula sp.), dão um exemplo bastante explícito da necessidade de uma precisão botânica, pois existem diversas espécies, sub-espécies e variedades que devem ser conhecidas e separadas, pois as suas virtudes são bem diferentes.

3.10.2. A escolha das plantas

As plantas devem ser, na medida do possível, selvagens ou sãs, a bem dizer provenientes de agricultura biológica.
As plantas selvagens de montanha têm um odor e uma actividade biológica extraordinárias, devido, por certo, ao forte teor em ésteres aromáticos donde a síntese é favorecida pela altitude, pela ensolação e pela secura, ou ainda pela simbiose estabelecida com as outras plantas selvagens do biótopo. Elas não estão sujeitas à poluição agrícola: adubos, pesticidas e herbicidas, estes últimos passam à destilação e alteram o óleo essencial (Franchomme,1990).
Actualmente, 98% das plantações industriais recorrem aos adubos e herbicidas químicos, favorecendo assim a aparição de doenças que até agora eram desconhecidas, contra as quais se luta com pesticidas de síntese altamente tóxicos como é o caso do lindano e outros.
Experiências provaram que uma simples administração de sais minerais solúveis no solo é susceptível de modificar claramente a composição físico-química de um óleo essencial (as variações observadas, por exemplo, na Mentha x piperita var. officinalis) (Franchomme, 1990).
É portanto evidente que uma certificação clara do modo de crescimento ou de cultura é indispensável para o consumidor que necessita de saúde e não, ao contrário, de ser insidiosamente envenenado.

3.10.3. Garantias sobre a extracção

A alta temperatura e a água prejudicam sempre, mais ou menos, os frágeis princípios aromáticos, o que induz a que os óleos essenciais conservem raramente a fragrância florida, a suavidade do perfume da planta ou mesmo da flor. É por isso que a destilação é um procedimento delicado exigindo experiência e uma manutenção especial:

- a escolha do alambique (Anexo II) tem a sua importância, tanto no que concerne ao seu princípio, como ao metal que o compõe. Existem alambiques em cobre, ferro e inox. Em cobre e em ferro existe uma grande probabilidade de se formarem óxidos,
- o bom controlo do aquecimento é igualmente importante uma vez que sobre baixa pressão, entre 0,05 e 0,1 bars, nenhum risco maior de sobreoxidação das moléculas existe. Repare-se por exemplo que a cor do óleo essencial de Thymus vulgaris em plena floração varia do vermelho claro ao vermelho acastanhado elevando a pressão de vapor.
- a duração da destilação sobre baixa pressão é necessariamente mais longa, e sem dúvida, ao contrário das condições em alta pressão (1,5 bars), uma destilação prolongada permite recolher a combinação das fracções ditas "de cabeça" e "de cauda". A título de exemplo, três quartos do óleo essencial de Thymus vulgaris, ao longo da destilação, são extraídos nos primeiros trinta minutos, mas 60 a 80 minutos suplementares (consoante a planta esteja seca ou húmida), são necessários para extrair a totalidade dos fenóis, demorados a passar (Franchomme, 1990).

Portanto, obviamente concluímos que, sendo o óleo essencial pago ao quilo, a tentação que ocorre é a de que quando se destila, ficar-se pela meia hora ou pouco mais, que é quando a maior parte do óleo saí, pecando assim no que respeita à qualidade do produto final.

3.10.4. Garantias sobre a qualidade dos óleos essenciais.

Após a colheita das plantas rigorosamente seleccionadas e a sua minuciosa destilação, não deverá intervir senão uma simples filtração após a qual o óleo essencial é armazenado em recipientes inalteráveis e herméticos colocados em lugar fresco. Estas precauções permitiram evitar a oxidação e a polimerização provocadas pelo ar, pela luz e pelo calor e que se traduzem por uma variação progressiva da cor e da fluidez dos óleos.
O acondicionamento em frascos opacos, pardos, escuros ou azuis, que sejam herméticos, é portanto necessário à sua protecção, de preferência sem serem de plástico ou borracha. O vidro será o mais indicado. A protecção será nula com vidro branco ou transparente, média com vidro amarelo o qual absorve os UV (radiações entre 3000 e 5000 A) e excelente com vidro azul que absorve uma faixa das radiações vermelhas (radiações entre 5000 e 7000 A)(Franchomme,1990).
O óleo essencial deverá ser 100% natural, ou seja, não desnaturado com moléculas de semisíntese ou síntese total de baixo preço, de agentes emulsionantes químicos, ou ainda de diluentes provenientes do petróleo. Essas profundas alterações são susceptíveis de tornar os óleos essenciais alergizantes e tóxicos, mesmo cancerígenos e leucemígenos (Franchomme, 1990).

3.11. Factores de variabilidade do óleo essencial

Os compostos aromáticos de uma planta não são imutáveis, pois eles variam em função de diversos elementos como a insolação, a natureza e composição do solo, etc.
Segundo Putievsky (1994) existem diversos factores que influenciam a constituição e a composição dos óleos essenciais, são eles:

- Genéticos: 1. Origem, 2. Variação, 3. Hibridação
- Morfogénese: 1. Posição e idade foliar, 2. Produção, 3.Floração
- Ambiente: 1. Temperatura, 2. Fotoperiodo e intensidade da luz
- Práticas agrícolas: 1. Nutrição, 2. Irrigação, 3. Reguladores de crescimento,
4. Micropropagação, 5. Colheita e destilação.

Assim, duas plantas idênticas podem secretar essências de onde as diferenças são mais ou menos importantes. Para diferenciar os óleos essenciais extraídos de cada uma das plantas, utiliza-se o termo "chémotypes" ou quimiotipos, termo derivado de "chimiotypes" significando simplesmente "raças químicas" (Franchomme, 1990). Estas diferenças podem ser extremamente importantes e mudar completamente as propriedades químicas ou biológicas do óleo essencial.
Podemos portanto depreender que uma mesma planta possa, crescendo em lugares diferentes, seja pela situação geográfica (altitude e latitude), seja pela natureza dos solos, secretar essências bastante diferentes. Esta variabilidade química em função dos biótopos é pré-determinada cromossomicamente.
Na verdade, estudos aprofundados mostraram que todos os tomilhos de uma mesma espécie sintetizam os mesmos compostos, mas em proporções extremamente variáveis, consoante o ambiente. A origem das variações deve-se essencialmente encontrar nas diferenças de natureza do solo por um lado, e da radiação solar por outro. De seguida podemos acrescentar que cada etapa da biossíntese está dependente de enzimas, dentro das quais diversas metálo-enzimas; que a natureza físico-química dos diferentes solos não oferece às plantas os mesmos oligo- e micronutrientes; e por outro lado, sendo as enzimas igualmente sensíveis às radiações luminosas, a mudança de radiação solar age sobre a síntese aromática (Franchomme, 1990); observe-se que no litoral os infravermelhos dominam, enquanto que no interior, em altitudes elevadas, os ultravioletas são mais abundantes.

Esta influência solar permite explicar de certa forma, as variações químicas ao longo do ano, encontradas nos compostos dos óleos essenciais. Assim, um tomilho no inverno exalando um odor característico de geraniol bem pronunciado, dará no verão uma fragância mais doce, sendo o geraniol em parte substituído pelo seu éster, o acetato de geranilo (Pellecuer, 1973).
De qualquer das formas, mesmo que as possibilidades de adaptação de uma mesma espécie a diferentes tipos de condições climáticas e edáficas, sejam determinadas geneticamente, isto não impede que a composição das essências de certas espécies de plantas transplantadas para fora do seu biótopo original, possa variar pouco na condição em que as diferenças de ambiente não ultrapassem um certo limite. Esta particularidade permite, graças à propagação vegetativa em cultura clonal, obter lotes de óleos essenciais em que, de antemão, conhecemos a sua composição.

3.12. As diversas utilizações dos óleos essenciais (Utilizações
alternativas)


Duas industrias partilham principalmente o mercado mundial florescente dos aromas, são elas a industria agro-alimentar e a perfumaria. De notar, por exemplo, que os extractos naturais (óleos essenciais, essências, concretos, absolutos, águas florais) não representam, nos dias de hoje, mais que uma ínfima parte das composições utilizadas em perfumaria, cosmética e higiene ("eaux de toilletes", águas de colónia, cremes, emulsões, géis, sabonetes, desodorizantes, dentífricos, etc.).
É no entanto desejável que uma evolução se desenhe em torno de uma abertura médico-farmacêutica da aromatologia, mais útil que a simples aromatização com essências de especialidades vitaminadas ou peitorais, alimentares e outras, como:

- os produtos alimentares: sumos de fruta e águas minerais aromatizadas, onde entram principalmente essências de citrinos; bombons, pastas, massas ou geleias de frutos; pastilhas elásticas; gelados; sopas, molhos; pastelaria, etc. De lamentar aqui a utilização abusiva dos aromas artificiais, pálidos reflexos dos aromas naturais desfavorecidos pelo seu elevado preço (Franchomme, 1990);
- o tabaco para cigarros ou charutos, onde o cheiro tem quase que mais importância que a qualidade das folhas;
- os medicamentos onde os óleos essenciais são correntemente utilizados a título de aromatizantes;
- os produtos de higiene e de beleza;
- os perfumes.

A desinfecção de certos locais ou objectos, faz também, frequentemente apelo aos produtos aromáticos que na maior parte das vezes são de síntese, apesar de existirem no mercado uma série de produtos pressurizados referindo terem na sua composição "essências naturais".
A utilização de óleos essenciais num difusor de aromas permite purificar, ionizar e criar um ambiente nos apartamentos e locais profissionais; eles são particularmente úteis em período de epidemia ou nos locais de risco (infantários, consultórios médicos, etc.); ensaios de desinfecção feitos em zonas de reanimação hospitalar, demonstraram a eficácia dos óleos essenciais comparada à dos produtos de síntese (Franchomme, 1990), sendo o odor dos primeiros sempre mais claramente apreciado que o dos segundos.
A desinfecção das madeiras (móveis velhos, traves, vigas, lambris, etc.) com complexos de óleos essenciais não é muito corrente, no entanto ela demonstra uma notável eficácia e evita por outro lado a utilização de produtos altamente tóxicos.
Outra área bastante importante em que podemos enquadrar os óleos essenciais, é a dos pesticidas biológicos no campo da agricultura.

Largas quantidades de pesticidas são utilizados mundialmente na protecção das culturas. A sua excessiva utilização conduziu a consideráveis riscos para a saúde humana, organismos auxiliares e vida selvagem. A crescente consciencialização destes riscos, juntamente com os problemas da resistência das pragas e doenças, avivou o interesse no uso de produtos derivados das plantas para controlar aqueles organismos. Os produtos bioactivos de origem vegetal, sendo biodegradáveis e menos persistentes para o ambiente, são potenciais alternativas aos pesticidas de síntese. Eles são reconhecidos como sendo seguros para o ser humano, menos tóxicos para a maioria dos organismos, e menos susceptíveis ou mais lentos no que respeita à criação de resistência por parte das pragas e doenças (Facknath, 1994).

A co-evolução entre as pestes de insectos e outros invertebrados, vertebrados e os seus hospedeiros, e a necessidade de adoptar uma estratégia de autodefesa, tem sido responsável pelo desenvolvimento de um vasto número de substâncias químicas (Facknath, 1994). Quase toda a planta desenvolveu um particular complexo químico composto de metabolitos secundários. Alguns deles são considerados aleloquímicos, protegendo as plantas dos inimigos. Reconhece-se que são geralmente importantes para a sobrevivência e a saúde das plantas. Os aleloquímicos são activos contra a competição das plantas vizinhas (alelopatia), dos microorganismos (vírus, bactérias, fungos) como podemos constatar pela actividade de certos óleos essenciais apresentados no quadro I, ou herbívoros (moluscos, artrópodes, vertebrados) (Jacobson, 1989). Eles agem como insecticidas, atractivos, repelentes, estimulantes nutritivos, dissuasores nutritivos (anti-nutritivos), estimulantes ou dissuasores de ovoposição, reguladores de crescimento, esterelizantes, tóxicos e como factores nutricionais (Hedin, 1991).

A importância dos pesticidas biológicos alcançou o seu pico durante o princípio deste século até à segunda guerra mundial. As substâncias derivadas das plantas, como o piretro, rotenona, e a nicotina, foram largamente utilizados como repelentes e tóxicos para os insectos, 20% ou mais do mercado comercial insecticida antes da IIª guerra mundial (Isman, 1994). No entanto, foram largamente abandonados durante a época em que se desenvolveu com sucesso os pesticidas sintéticos como os organoclorados, os organofosforados, carbamatos, e mais recentemente os piretroides sintéticos. À medida que a população mundial caminha para uma era em que a crescente procura de produtos biológicos com a mínima utilização de químicos sintetizados na agricultura ou noutras áreas, se faz sentir, os produtos secundários das plantas, neste caso os óleos essenciais, vão assumindo uma importância relevante. Extractos derivados de plantas e fitoquímicos estão sendo reexaminados visando potenciais produtos úteis, promovendo alternativas ao actual arsenal de pesticidas, ou como modelo para novas classes de pesticidas sintéticos (Hart,1974; Duke e Lydon, 1993; Langenheim 1994). Uma vasta literatura começa a estar disponível no que respeita aos vários aspectos dos pesticidas biológicos, seja na área de entomologia, patologia, controle de infestantes e nematodologia (Facknath, 1994).

Num programa estabelecido com vista à optimização das funções criativas, as essências e óleos essenciais podem assumir um papel sem dúvida bastante mais importante do que as actuais condições de existência conseguem permitir pelo afastamento daquilo que a natureza nos oferece, do "natural".
Assim, para um futuro melhor, os óleos essenciais encontrarão a sua função original, melhorando a saúde e aumentando a luz da nossa vida.

É sabido que somente ainda 5% da flora mundial é que foi quimicamente investigada até à data. No mundo das plantas é bem provável que se encontrem substâncias bem mais complexas e difíceis de isolar do que aquelas que a tecnologia de hoje consegue sintetizar quimicamente, mas também, sem dúvida que aí poderemos encontrar uma maior fiabilidade no que respeita à origem e integridade da estrutura química própria da essência vegetal. Por outro lado, o homem começa-se a aperceber que existe algo mais para além da simples estrutura material, molecular e química da substância vegetal que ele não conseguiu ainda explicar e formular, e essa é a diferença. É hora portanto, de reverter o quanto possível, o rumo e o processo de investigação, dando uma maior atenção não ao que o homem consegue sintetizar ou manipular com as suas mãos, mas sim ao que a natureza nos dá, pois é provável que ela tenha mais consciência naquilo que cria do que nós.
   


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Impresso em 25/4/2024 às 5:14

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