Por Nicola Jones e revista Nature
A poeira não quer se assentar em uma acalorada discussão sobre se impactos de meteoritos podem ter provocado um dos períodos frios mais famosos da Terra há 12.900 anos.
A nova evidência na polémica surgiu em forma de pedaços de leito de rocha do Quebec, no Canadá, que parecem ter sido detonados violentamente e espalhados por uma área enorme, chegando até a Pensilvânia, nos Estados Unidos. “Eu diria que certamente há evidências de que houve um impacto”, afirma Mukul Sharma, um geoquímico de isótopos no Dartmouth College, em Hanover, New Hampshire, e co-autor de um estudo publicado no dia 2 de Setembro na Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS).
Entre 11.600 e 12.900 anos atrás o clima do planeta mudou rapidamente: em latitudes setentrionais, como na Groenlândia, as temperaturas médias desceram vários graus em menos de um século e ninguém sabe o que causou esse período relativamente breve de congelamento, conhecido como Dryas Recente.
A principal teoria é que a movimentação de glaciares da América do Norte permitiu que um grande volume de água doce de degelo entrasse nos oceanos Atlântico ou Árctico, diminuindo a circulação oceânica e resfriando o hemisfério norte. Essa ideia gerou preocupações de que a água doce do actual derretimento do gelo também possa provocar uma mudança climática acelerada.
Uma grande explosão
Uma teoria alternativa é que cometas ou meteoritos explodiram sobre ou se chocaram contra a América do Norte, provocando vastos incêndios e levantando uma densa nuvem de poeira e fuligem que resultou em um colapso glacial.
Em 2007, pesquisadores relataram evidências para um evento desses com base nos restos de assentamentos humanos que existiam no continente naquele período.
Os críticos da teoria foram incapazes de replicar muitos desses estudos e têm questionado se as partículas encontradas eram de fato de uma explosão de impacto.
Além disso, ninguém encontrou sinais de grandes incêndios grassando pela América do Norte. “Não me parece que eles tenham construído uma hipótese muito boa”, observa o geólogo sedimentar Bruce Simonson do Oberlin College em Ohio. “Se isso é o melhor que puderam fazer, a teoria ainda não ‘decolou’”.
Mas a ideia está ganhando adeptos. Atualmente ela é apoiada por pelo menos 55 autores que, em conjunto, já publicaram 11 artigos científicos, informa James Kennett, um paleo-oceanógrafo da University of Californiaem Santa Barbarae um dos principais proponentes da teoria. “A ideia continua evoluindo”, diz ele. Em julho, outro grupo de pesquisadores que examinava núcleos de gelo da Groenlândia anunciou a descoberta de platina meteórica resultante de um grande impacto no período Dryas Recente.
Um golpe de sorte
Sharma e seus colegas estão entrando na briga. O geoquímico diz que os minerais que encontrou no solo profundo da Pensilvânia foram criados a temperaturas superiores a 2.000ºC e formaram gotículas vitrificadas que se fundiram em pleno ar. Essas partículas só podem ser explicadas por um impacto, afirma ele. Um forno industrial poderia fazer isso, mas qualquer fonte em potencial é recente demais, distante demais no tempo. “Tiramos a grande sorte”.
Os minerais foram identificados depois que Yvonne Malinowski, uma habitante da Pensilvânia, viu um documentário de televisão sobre o Dryas Recente e enviou a Kennett uma caixa cheia de rochas que encontrou em suas terras. Kennett então repassou as informações a Sharma.
A composição isotópica dos minerais indica que as rochas vieram de uma área de alguns milhares de quilómetros quadrados no Quebec, sugerindo que um meteorito se chocou violentamente contra a camada de gelo da América do Norte, derretendo e ejectando pedaços do leito de rocha, explica Sharma. “Essa é uma prova inequívoca de um impacto com a Terra”, diz Kennett.
O paleoclimatólogo Anders Carlson, da University of Wisconsin-Madison não está convencido de que as gotículas vítreas são tão singulares ou significativas como Sharma acredita. “Observamos as mesmas evidências datando de períodos fora do Dryas Recente”, argumenta.
De acordo com Sharma, o factor crítico será encontrar a cratera. Embora não tenha experiência em “caçar crateras”, ele está elaborando uma proposta.
Mark Boslough, no entanto, físico de impacto no Laboratório Nacional Sandia, em Albuquerque, no Novo México, considera um achado desse tipo improvável. Se tivesse havido um impacto, “haveria uma enorme cratera bem óbvia”, diz ele. “Não precisaríamos discutir sobre isso”.
Steven Stanley, um paleobiólogo da University of Hawaii em Manoa, em Honolulu, tem actuado como ‘editor pessoal’ em várias dissertações do PNAS sobre esse tema, inclusive no novo trabalho de Sharma e no artigo original de 2007 que propôs a ideia. “Tudo isso tem sido muito controvertido”, admite. “Acredito que ajudaria publicar esse material. Ele precisa ser veiculado; não é nada de estranho”.
O PNAS normalmente se vale da opção de um ‘editor pessoal’ para artigos considerados excessivamente controvertidos para receberem uma opinião justa do processo de revisão padrão.
O paleobiólogo diz estar cada vez mais convencido da teoria do impacto como mecanismo que provocou as inundações de água doce. “Eu não sei como as pessoas podem ser tão negativas a essa altura. O caso só está começando a tomar forma”.
Este artigo foi reproduzido com a permissão da revista Nature. O artigo foi publicado originalmente no dia 2 de Setembro de 2013.