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Ininterruptamente
de Maria
em 28 Set 2011
Assim corre o tempo. Enquanto nos movemos no tempo, o dia-a-dia ocupados nos afazeres, fluímos com ele numa corrida ininterrupta para o futuro, mas se pararmos um pouco, então damos conta do tempo, que assim nos parece que também parou, quando afinal fomos só nós, ao tomarmos consciência dele.
Diz o cientista Richard Feymam:
«O tempo é o que acontece quando nada acontece».
Também Aristóteles:
«O tempo é o número do movimento segundo um antes ou um depois».
Convertendo estes pensamentos numa linguagem mais presente, diremos que o agora, o tempo no agora, existe apenas numa questão de segundos, ou mesmo que ele não existe, pois o tempo é tão efémero, que nunca o podemos reter. Quando estamos a passar momentos felizes, temos a tendência de os querer perpetuar no tempo, saboreando o momento - mas logo se esvai num agora que é futuro; o futuro minuto a minuto, o aqui e agora, não tem limites na sua fuga, ou seja o futuro é uma ameaça constante ao presente. Regozijemo-nos, no entanto, pelo facto de tanto acontecer nas situações boas que queremos eternizar, como nas más que desejamos passem depressa.
Diz Santo Agostinho:
«Mas, afinal, uma coisa é certa: nem o futuro nem o passado é, e não se pode dizer na verdade: são três os tempos: passado, presente e futuro; deveríamos antes dizer, para sermos mais precisos: são três os tempos: um presente de passado, um presente de presente e um presente de futuro. Com efeito, estes tempos são uma espécie de trindade na alma, e não os vejo noutro lugar: e, decerto, existe aí o presente de passado, nomeadamente, a recordação; o presente de presente, a saber, a evidência; o presente de futuro, ou seja, a expectativa».
A passagem da acção para a inércia ou vice-versa é a simultaneidade numa sucessão do tempo, captada pelos nossos órgãos dos sentidos, através dos quais tomamos consciência e registamos essa transição. Na verdade estamos à “mercê” do tempo – e isto é irreversível, pelo que só nos resta saber gerir o “nosso tempo” tirando o máximo proveito da escassez ou da abundância de tempo; escassez causa stress, abundância causa tédio. O modo como vivemos o decurso temporal do agora, momento presente, depende essencialmente do que fazemos e suas repercussões no momento e no a seguir, o futuro.
Martin Heidegger, que defende o presente como uma dimensão temporal diz:
«Cada agora também já é um ainda-agora ou um logo-a-seguir», e ainda «Cada último agora é enquanto agora, desde sempre, um imediatamente-já-não, portanto, tempo no sentido do agora-já-não do passado; cada primeiro agora é sempre um mesmo-agora-ainda-não, portanto no sentido do agora-ainda-não do futuro».
Consequências boas ou más são o produto desta inter-acção do tempo com a nossa Consciência, se mais desperta ou mais adormecida. Quanto mais desperta mais defesa temos, não contra o tempo, mas no tempo, caminhando e fluindo com ele: tudo depende da nossa competência mental.
Se o tempo é eterno, numa comparação ao período de vida dos seres humanos, o mais sábio é integrarmo-nos na dimensão espacial e temporal da sua regência, não o contrariando, numa adaptação evolutiva à determinação implacável da natureza.
A importância do tempo depende em parte da realidade de cada um, enquanto dimensão pessoal. Por exemplo, se estou inspirada na escrita não dou pelo tempo passar, fluo com ele – é um presente eterno. Se estou inspirada na pintura é um “perder-me” no tempo – ele deixou de existir na minha consciência. Só “retomo” o tempo, quando termino a acção de pintar, que me pareceu terem-se passado trinta minutos, quando afinal passaram três horas. A noção de tempo esvai-se quando pinto, mais do que quando escrevo. Naturalmente que gosto mais da escrita: sou mais presente, mais Consciente.
Na escrita é a criação do pensamento pela palavra certa que defina com exactidão e clareza o que pretendo dizer – é um presente de Consciência – inteligência. Na pintura é a criação abstracta, indefinida por vezes, através do contraste da cor – torna-se mais subtil e intemporal: foge-me mais o tempo…
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